A adição de corantes e outros ingredientes marca um novo capítulo na disputa pelo mercado brasileiro de cervejas.
Recentemente, um decreto do governo brasileiro suspendeu diversas restrições para produção da bebida alcoólica preferência nacional. Com a nova lei, foi liberado o uso de vários corantes e também a adição de produtos de origem animal, por exemplo.
O decreto é uma grande faca de dois gumes. Ele possui pontos positivos para quem curte saborear uma cerveja diferente e também para quem produz essas bebidas, mas também pode acarretar uma concorrência desleal, já que as grandes produtoras devem baratear ainda mais o custo de seus produtos.
O Brasil fechou o ano passado com 889 cervejarias em operação. Nessa soma estão apenas as que têm fabricação própria, portanto se somadas as ciganas (que usam instalações de terceiros) a quantidade é bem maior. Os números fazem parte do Anuário da Cerveja no Brasil 2018, divulgado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).
Segundo a publicação foram concedidos aproximadamente 6,8 mil registros de produtos para cerveja/chope, 210 novas fábricas foram abertas, ou seja, a cada dois dias uma cervejaria abriu as portas no país. No ranking dos municípios com mais estabelecimentos, Porto Alegre está em primeiro lugar. São 35 cervejarias registradas na cidade.
Imagine o acirramento desta disputa diante do novo decreto. Pelo que vimos nas redes, as reações de quem produz cerveja artesanal ficaram equivalentes.
Alguns donos de cervejarias comemoraram a flexibilidade na lei que era muito restritiva para o pequeno fabricante por algumas questões, principalmente na hora de registrar produtos. Existia uma classificação antiga de cerveja leve, forte, extra, que estava um pouco defasada. Não existia a classificação de hidromel, cidra, de muitos destilados e que meio que foram condicionadas lá. Com isso as pequenas cervejarias poderão abusar de outros sabores e da adição de produtos de origem animal, como mel e leite, já que antes, bebidas com esses produtos não eram consideradas cervejas.
Para quem não viu com bons olhos, o motivo é a desconfiança com o governo. Estes microempresários entendem que não tem sentido de uma hora pra outra o governo mudar isso aparentemente para o pequeno produtor. Está tendo muita conversa e análise. Quem analisou o texto do decreto com mais atenção diz que parece que ele foi feito para cativar o pequeno produtor, mas às vezes pode beneficiar mais as grandes.
O ponto problemático do decreto é que ficou muito aberto: não diz quais corantes podem ser usados ou a quantidade. Um dos desconfiados microcervejeiros resumiu: "Imagine que uma das marcas populares de cerveja vá vender a bebida dizendo que ali tem laranja. Para isso, pega um extrato sintético que é usado na produção de balas, pinga duas gotinhas lá dentro e pronto, coloca no rótulo que é cerveja com laranja. O pequeno produtor quando quer usar alguma fruta tem todo um processo de colheita, desidratação e tratamento da casca. Na prática, o custo de produção e o valor de venda serão bem mais baixos para a grande cervejaria".
E o consumidor? Sofrerá com uma explosão de corantes e outras adições que prejudicarão ainda mais a qualidade das marcas populares? Ainda é difícil responder. Na prática, pode ser que não mude nada. As grandes cervejarias podem continuar fazendo o que elas fazem e as pequenas também. Mas, se aumentarem indefinidamente o uso de corantes e outros aditivos, isso pode fazer mal ao organismo de quem sustenta a indústria. Sem contar os agrotóxicos e os abomináveis cereais não maltados…
Só que sabemos como funciona o jogo: se tem como baratear para conseguir mais lucro, o olho gordo do mercado brilha. Resta aos meros mortais e apreciadores ficarem atentos, já que é na boca e no corpo que vem os efeitos dessas mudanças. Você também tem a opção de viver pensando que o livre-mercado e as promessas de grandes cervejarias são completamente confiáveis; , mas até aí, azar o teu, colega.