ESG

ESG: um grande dilema ou uma desculpa esfarrapada

Reconheço que existem empresas muito sérias e que trabalham o ESG de forma a gerar mudanças importantes nos ecossistemas onde atuam. Entretanto, grande parte adota essas práticas como forma simples de dizer que estão contribuindo para evitar o pior e que estão fazendo sua parte.

Em nossa vida pessoal, tomar decisões profundas em relação ao nosso comportamento é sempre uma tarefa árdua. Muitas delas são expressas naquelas famosas agendas de segunda-feira, ou mesmo nas metas para o ano que vai entrar. Para essas, já sabemos o resultado da maioria. Mas, quando se trata de nós conosco mesmos, as responsabilidades são assumidas e responderemos por nossas escolhas à medida que o tempo passa.

Muitas vezes não entendemos a priori um acontecimento, porém, basta pensar um pouco, retroceder no tempo, para enxergarmos, que o que está rolando, nada mais é do que a consequência do que fizemos ou deixamos de fazer no passado. Como sabemos, a vida é feita de escolhas.

Essa pequena introdução vale para determinar o grau de protagonismo que temos em nossas atividades, sejam elas profissionais ou pessoais. Muito bom, mas e daí, o que tem a ver isso com a vida corporativa?

Pensando-bem, talvez até não tenha nada mesmo. O que estou querendo traçar aqui é uma linha de pensar, para chegar às decisões empresariais que hoje fazem parte das atividades empresariais. Assim, temos empresas, conglomerados, organizações, que integram e são signatários de inúmeros tratados que envolvem sustentabilidade, diversas cartas de compromisso, metas, neutralização de carbono, e por aí vai. 

A notícia perversa é que parece que, na maioria, os signatários meio que calculam, quando não mais habitarão este planeta e se comprometem com prazos, no máximo para poucos anos depois que isso acontecer. E pior, não enxergam o mundo ao redor. Ou melhor, não querem enxergar. As questões referentes ao clima não vão mais acontecer no futuro. Já estão em curso, haja vista os desastres naturais que estamos testemunhando. Na esteira da crise climática, as diferenças sociais não param de crescer. E já temos disputa por territórios em uma guerra silenciosa.

A questão me parece mais uma vez muito simples: nossa empresa plantou mais de 100 mil árvores nos últimos seis meses. Quantas estão vivas? Plantar é uma coisa, fazer crescer é outra. É linda aquela promoção que dá mudinhas dentro de um tubinho, na compra de mata-mosquito que não polui. Todos ficam felizes, e depois lustram suas medalhas. 

Reconheço que existem empresas muito sérias e que trabalham o ESG de forma a gerar mudanças importantes nos ecossistemas onde atuam. Entretanto, grande parte adota essas práticas como forma simples de dizer que estão contribuindo para evitar o pior e que estão fazendo sua parte. Mas o que acho mais complicado é que saem por aí alardeando suas práticas, que têm prazo para resultar em alguma mudança em 2030, quando provavelmente seus executivos já terão morrido e por isso não mais terão que se preocupar com tais incômodos problemas.

Contudo, meus amigos, não é isso que quero trazer aqui nesta reflexão. Fico tentando entender como empresas que aderiram aos Princípios do Equador, participaram do último encontro sobre o clima, de forma ativa, inclusive, e ainda são protagonistas em outros movimentos, podem se dizer comprometidas com os conceitos ESG, mas não são capazes de, por exemplo, rever seus prazos de pagamento a fornecedores (sei de algumas que pagam em 120 dias, fora o mês de prestação de serviço) ou que praticam juros abusivos, quando parcelam compras a seus clientes ditos Gold, por exemplo. E são Gold na medida em que deixam um resultado espetacular, só no giro do dinheiro, sem ter produzido qualquer produto.

Também temos aquelas empresas que preferem comprar insumos fora de sua região, prejudicando assim a economia local por uma diferença de centavos. Ou mesmo aquelas que não pagam horas extras, ou que exigem que as tarefas sejam todas cumpridas dentro do horário de trabalho, não importando se isso é ou não viável.

O ESG certamente não resiste à troca da sacola de plástico por papel ou, pior ainda, para não incentivar o uso das sacolas de plástico, as empresas as vendem, numa forma de atender bem as demandas da sociedade. Meio esquizofrênico, não? Temos a mania de tratar essa questão sempre com pouca ou nenhuma profundidade e clareza, concordam?

Observo empresas de vários setores abordando esse assunto somente pelo ponto de vista de marketing, infelizmente para mim, que sou profissional da área. 

Nós temos a facilidade de através da manipulação correta das palavras, vender uma atuação nos 3 pilares, sem realmente percebermos consistência no que nos é passado por briefing. Quando atuamos, fornecendo serviço para esse tipo de empresa, muitas vezes temos que comprar materiais provenientes de lugares onde sabidamente os operários trabalham quase em regime de escravidão, ou mesmo contratar geradores movidos a diesel e não biodiesel, para chegar a um valor competitivo. 

Além disso, muitas vezes aceitamos participar de uma concorrência entre 4, 5, 8 agências para um evento de lançamento do programa de ESG de uma empresa.

Nessa análise de custos não entra, seriamente, o posicionamento que a empresa assume diante da sociedade, como guardiã dos conceitos ESG. 

É em momentos como esse que aqueles com poder de decisão, em relação a essas ambiguidades existentes em nosso dia a dia deveriam atuar.

O que vai acontecer com o nosso planeta? Não se preocupem, já está acontecendo. Quanto às empresas que adoram se pendurar no que tratam como modinhas, espero que desapareçam.

Entretanto, se nós, profissionais envolvidos nessas áreas, não assumirmos o papel de protagonistas e não sairmos trabalhando para que haja uma reversão neste cenário, vamos continuar convivendo com produtos que se valem da química para atrair seus consumidores ao anunciar suas novas fórmulas ou de alguma bateria milagrosa que dura mais, ao custo de poluir o ambiente.

ESG é uma definição de protagonismo que deve ser exercido pelos que ainda creem que podem dar sua contribuição. Caso isso não seja possível, melhor acharmos um novo planeta para nós, ou corremos o risco de não ter para onde ir, muito brevemente.

Nota do autor – em plena primavera, São Paulo atingiu mais de 30 graus celsius de temperatura.

Foto: Depositphotos