Nos corredores de agências e nas conversas entre profissionais, há um termo que parece cada vez menos utilizado: o BTL (below the line ou abaixo da linha, em tradução).
O desaparecimento gradual do termo não reflete o fim do ramo — pelo contrário, a área vive seus anos dourados. Mas, pela cultura organizacional do Marketing e pela própria semântica do “abaixo da linha”, a sigla, ao que parece, não é mais bem-vinda.
Em outros tempos, somente as siglas ATL (Above The Line ou acima da linha) e BTL bastavam no universo da Publicidade e do Marketing. ATL refere-se a estratégias de publicidade de massa, que têm por objetivo alcançar um grande número de pessoas, como anúncios de televisão, rádio e outdoors. Por outro lado, BTL envolve ações segmentadas, cujo objetivo é a conversão qualificada, como eventos e feiras.
Apesar dos termos ainda existirem, com a evolução da internet e as mudanças no mercado, a linha que difere os dois é cada vez mais tênue. Além disso, essa divisão propõe uma hierarquia de quem está “acima” e quem está “abaixo”, o que não agrada muitos dos profissionais que trabalham na área já resumida como BTL e hoje se identifica como Live Marketing, Brand Experience e suas variações e especializações.
Neste artigo especial, vamos entender o contexto geral do termo e porque ele estaria ultrapassado dentro do setor.
Intersecções entre ATL e BTL
Na segunda metade do século XX os termos começaram a se difundir, sendo que as ações “abaixo da linha” representavam uma abordagem mais econômica e a estratégia de aplicá-la não representava tanta relevância, na maioria das vezes, na comunicação das marcas.
Todavia, atualmente, as ações presenciais com consumidores cresceram consideravelmente em importância dentro das estratégias de comunicação e já dividem uma boa parcela dos budgets de marketing das grandes marcas, quando bem planejadas, em conciliação com ações de marketing digital e publicidade.
“Hoje em dia, uma experiência de live marketing envolve tecnologias embarcadas, como realidade aumentada, então essas ações de experiência acabam custando um pouco mais. Por isso, para definir o que é ATL e BTL, o que importa é o que a gente quer com a ação. Se é o alcance ou a conversão. O meio em que essas ações acontecem ou o custo que elas geram ficam em segundo plano”, aponta o Doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo (USP) e Coordenador dos Cursos de Pós-graduação em Comunicação no Centro Universitário Internacional – UNINTER, Clóvis Teixeira Filho.
Uma “linha” incerta
Além da crescente sobreposição entre ATL e BTL, o próprio termo “abaixo da linha” gera bastante controvérsia — por que não se sabe ao certo que “linha” é esta. Para alguns, trata-se da linha orçamentária, já citada anteriormente, mas por um motivo complementar: por supostamente as ações BTL ficarem com o “resto” do orçamento.
“Durante muito tempo isso foi verdade. Os grandes investimentos eram feitos em ações ATL e o BTL não tinha tanta importância. Isso dava a sensação para alguns profissionais que o que eles estavam fazendo era considerado uma atividade secundária”, afirma a CEO da Agência Flagship, Ale Bossi.
Para o CEO da F/Malta, Felipe Malta, os dias do termo estão contados: “O termo BTL não é o mais adequado para definir as ações de eventos e o nosso trabalho com live marketing. Passa sim um ar pejorativo”.
Nesse contexto, a crítica é quão forte essas ações são hoje para a gente falar que elas estão abaixo de uma linha tênue da publicidade. “A gente teve um crescimento da manifestação das marcas no nosso cotidiano, com outras ações que fogem dos veículos tradicionais. Se a gente entender below the line como aquilo que está abaixo e trabalha nas entrelinhas, talvez o termo não seja aplicável mais”, diz o professor.
“Hoje já vemos grandes marcas invertendo o grau de importância das atividades e, portanto, de investimento também. Não é de se estranhar marcas que tem como principal estratégia hoje em dia focar suas atividades em Brand Experience, por exemplo”, complementa Bossi.
Novos termos
Com as mudanças na prática do marketing, a sigla passou a ser encarada mais como um guarda-chuva do que como uma área de atuação em si.
“O below the line está sendo substituído e entrando em desuso. Alguns usam como próprio sinônimo o termo no-media. A gente vê essa divergência também no universo acadêmico”, afirma o professor Clóvis Teixeira Filho.
“Surgiram novas disciplinas e novos termos para explicar uma atividade. ‘Ações com Influenciadores’ e ‘Experiências de Marca’ são dois termos que vemos muito ultimamente”, afirma a CEO da Flagship. Já Felipe Malta adiciona Live Marketing à lista: “Marketing de experiência, Live Experience, eventos e Live Marketing são mais comuns hoje em dia, além de mais precisos”.
“Eu acho que o termo BTL e ATL ficou marcado e ainda é fonte de pesquisa para explicar o que se faz, como se faz. Mas na prática, acho que cada vez menos, os rótulos são usados. Mesmo porque, hoje em dia, os profissionais transitam muito bem entre as ações de marketing e recursos disponíveis no mercado. O cliente quer ideias e resultados que façam a diferença, não importa se vem do ATL ou do BTL”, conclui Bossi.
Chame do que for, mas aposte nisso
O live marketing se desenvolveu a partir dessa ideia de levar a publicidade para fora da mídia tradicional. As marcas estão entendendo que oferecer experiências ao vivo é um trabalho que vale a pena, pois promove uma interação direta com os consumidores e cria memórias duradouras. “Eu vejo o que um dia foi a publicidade BTL como as ações que trazem pra vida real as campanhas de diferentes mídias”, conta Felipe Malta.
Há um diferencial neste tipo de ação: a capacidade de surpreender os consumidores em momentos inesperados. O que, definitivamente, não acontece na mídia tradicional. “Hoje em dia, quando você abre um site, a primeira coisa que você faz é aceitar os cookies, que fazem todo o rastreamento do consumidor. Então, isso já traz a propensão para a pessoa de que ela vai encontrar publicidade lá”, comenta o professor Clóvis Teixeira Filho.
Em contraste, as ações de live marketing encontram o indivíduo nos seus momentos rotineiros e geram um impacto mais direto. “Por isso que ações criativas de promoções, sampling e eventos são diferenciais. A marca quebra a barreira que as pessoas têm contra a publicidade”, conclui o Coordenador de Pós-Graduação em Comunicação da Uninter.