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Posicionar-se como referência em atendimento e usar essa característica para alavancar serviços que complementam seu portfólio é o pulo do gato que muita empresa deseja – ou deveria querer – dar. Mais do que reter, é preciso cuidar e humanizar as relações, enxergando as pessoas com um olhar mais amplo. É dessa forma que as grandes companhias, principalmente no varejo, têm se diferenciado e conquistado mercados com margens acirradas.
Na era do omnichannel e da mentalidade Life-centric, as empresas na vanguarda não querem apenas atender bem. Elas buscam excelência – querem transformar qualquer ocasião de contato em uma lembrança memorável e priorizar também o planeta, a vida e os valores das pessoas.
Tendência dos últimos Fóruns Econômicos Mundiais, o capitalismo de stakeholders desafia as empresas a contribuir com o mundo além do lucro e dos empregos que geram. Elas propõem fazer isso vislumbrando justamente a sua comunidade, colaboradores e principalmente os seus clientes.
Nesse processo, é normal que muitas organizações promovam uma reflexão sobre sua essência e o que primordialmente motivou seu surgimento. Afinal, para os consumidores em geral, a maneira como a empresa dialoga com os valores e com o universo delas tem sido mais importante do que o produto que a priori comercializa.
O foco no cliente e na experiência proporcionada a ele, como um diferencial do negócio, não começou de hoje. Não se tem certeza de quando nasceu o conceito de atendimento e como ele chegou aos moldes que conhecemos atualmente, mas os japoneses têm uma contribuição importante nessa história, que começa no Japão feudal, no século VIII, com um estilo peculiar de hospedarias chamadas de ryokan.
Projetadas principalmente para atender samurais que viajavam pelo país, eram mais que um simples local para dormir. A hospedagem incluía futons para descanso, roupões, banho em águas termais e até cerimônias de chá – tudo minuciosamente preparado para receber os hóspedes, geralmente cansados de suas longas viagens. Essas pousadas japonesas se destacavam pela experiência única que proporcionavam não só no quesito de estrutura e ammenities, mas pelo modelo de negócio cuja base era o anseio em adivinhar as necessidades dos seus visitantes.
Esse desejo genuíno de tratar bem os viajantes deu origem a um conceito chamado Omotenashi.
Dentre suas várias traduções, denomina um serviço altruísta, de coração aberto e que se antecipa às vontades do cliente. De tal maneira que não se faça mais necessário falar de si – os próprios consumidores trarão suas impressões sobre a marca divulgando a empresa de forma fidedigna e sólida.
Os séculos passaram e o Omotenashi segue enraizado na cultura japonesa. Até os dias de hoje, hospedar-se em um ryokan é um “must” de qualquer viagem para o Japão. É uma experiência cultural inesquecível que oferece uma imersão na cultura do país, onde atender bem é quase uma arte. Os cumprimentos não só dão boas-vindas, mas transmitem a energia do lugar. Os gestos são minuciosos e elegantes, os lugares são bonitos e os rituais, impecavelmente pensados para agradar os cinco sentidos.
Omotenashi nas empresas
Provavelmente, a maior barreira para um conceito como este chegar ao cerne das empresas é sua proposta radical de altruísmo, à medida que muitas companhias ainda estão atreladas a uma noção tradicional de que as áreas de atendimento existem isoladas das outras e funcionam à margem do modelo de negócios. A grande questão, no entanto, é que, no momento de grande competição em que vivemos, encantar em vez de atender pode ser um grande diferencial.
Muitas organizações ainda enxergam o consumidor apenas como “fonte de renda”. É preciso abandonar essa visão, construir relacionamentos verdadeiros e ter em mente que a coisa mais importante do mundo é o próprio mundo. É necessário somar os atributos racionais e os valores emocionais. Uma marca precisa ser sustentável, acessível, inclusiva, representativa, transparente, democrática e humana.
O passo mais prático seria integrar a área de atendimento à de insights, business intelligence, vendas e desenvolvimento de produtos. Afinal, é esse departamento que escuta como o cliente acredita que produtos, processos ou serviços deveriam ser melhorados.
Um outro movimento importante seria infundir preceitos do Omotenashi à cultura da empresa. Para encantar o cliente, é preciso humildade, escuta ativa, conexão, rapidez na aplicação de novas ideias, altruísmo, vontade de aprender e de encantar, comprometimento e compreensão do que é, de fato, hospitalidade. E essas são características necessárias a todos os colaboradores – não só os da área de atendimento.
Não basta só atender bem. O futuro é das empresas que, tal qual os japoneses no século VIII, desenvolveram seus modelos de negócios nos moldes da satisfação dos seus clientes.