A AmBev (subsidiária brasileira da maior cervejaria do mundo) adotará prazo de 120 dias para pagar seus fornecedores no Brasil, quando apropriado. A medida gerou revolta nos Estados Unidos e Europa e enfrenta dura posição contrária da American Association of Advertising Agencies – AAAA –, a poderosa 4A’s norte-americana.
A mesma decisão sobre a política de pagamento foi estabelecida recentemente pela AB InBev (Anheuser-Busch InBev) no exterior
Tom Finneran, vice-presidente executivo e agency management services da 4A’s, criticou duramente a medida. “Existem inúmeros acordos contratuais dos fornecedores com seus empregados e outros contratados. A InBev está usando de forma inapropriada esta medida para implementar o financiamento dos seus negócios. Uma agência que cria um comercial para a InBev e produz o filme contrata talentos para aparecer na tela e eles têm que ser pagos logo depois de fazer o trabalho. A agência não tem como mudar esta regra e não pode pagar por isso. Essa é uma medida grosseira. A InBev decidiu destinar US$ 55 bilhões para uma aquisição e agora estão tentando cortar custos desta forma, em cima dos fornecedores”, comenta, citando a compra da Anheuser-Busch no ano passado.
O vp executivo da 4A’s observa que em uma produção existem diversas pessoas envolvidas e que elas precisam ser pagas em uma semana ou duas após a conclusão do trabalho. “E como eles imaginam que vamos arrumar este dinheiro para pagar estes profissionais?”, questiona. Ele acredita que duas coisas podem acontecer com esta nova regra da AB InBev. “Os contratos para a empresa vão ter um aumento de preços, com os custos financeiros mais altos. E acredito ainda que alguns fornecedores vão optar por não trabalhar com eles porque não querem assumir este prejuízo”, fala.
Sobre as críticas que a medida tem recebido, a AB InBev reforça que valoriza seus fornecedores. “Pode levar tempo para alguns deles serem incluídos neste novo formato de pagamento, mas, quando forem, faremos o possível para ajudá-los nesta transição. Os termos são definidos como parte comercial das negociações entre cliente e fornecedor e vamos estabelecê-los de comum acordo”. Fonte do propmark, que prefere não se identificar, aponta que muitas empresas estão aproveitando a crise econômica para apertar fornecedores. “Eles aproveitam o clima de crise para vender a ideia de aumentar a rentabilidade. Como hoje a agência de propaganda é a “Geni”, todo mundo bate nela. Ela agrega no processo, mas no fundo repassa muito do que ganha para os fornecedores. Uma medida como esta da Ambev no Brasil com certeza aumentará os custos para eles, a agência vai repassar um aumento natural que acontecerá por parte dos fornecedores”, acredita. Mesmo assim, ao contrário da opinião de Finneran, ele acha que a AmBev ganhará no fim das contas com esta medida. “E não me surpreenderei se outros clientes fizerem o mesmo. 120 dias é uma paulada, mas acho que muitos podem aumentar o prazo de 30 para 60 dias”.
Já a AmBev brasileira alega que o cenário econômico mundial levou a empresa a rever as condições de pagamento aos fornecedores. “Ampliaremos, quando apropriado, os prazos de pagamento para 120 dias, respeitando a legislação brasileira e os contratos vigentes. A AmBev respeita e valoriza todos os seus fornecedores e, por isso, ajudará aqueles que tiverem qualquer dificuldade neste período de transição”, diz a empresa em comunicado.
Reações do mercado
Luiz Lara, presidente da Abap (Associação Brasileira de Agências de Publicidade) e da Lew’Lara/TBWA, afirma que a entidade tem conhecimento sobre a tentativa de alguns anunciantes de prorrogar, desde o final do ano passado, o prazo de pagamentos às produtoras e cuja proposta foi refutada pela Apro (Associação Brasileira das Produtoras de Audiovisual).
“A Abap é parceira da Apro e apoia totalmente essa visão, porque não há como viabilizar prazos de pagamento mais estendidos que os 30 dias, uma vez que as produtoras mexem com uma rede de valor, envolvendo talentos de profissionais e custo de locação e equipamentos. É impossível para as produtoras dispor de capital para poder arcar com a remuneração de inúmeros profissionais, que também garantem o resultado final de um bom comercial de televisão e rádio”, afirmou Lara.
Produtoras de filmes publicitários serão as mais prejudicadas
Além da AmBev, outros grandes anunciantes também estão adiando o pagamento aos fornecedores de comunicação. A Apro (Associação Brasileira das Produtoras de Audiovisual) denuncia que o atraso nos pagamentos por parte dos anunciantes às agências chega às produtoras em efeito cascata. “Isso é óbvio. O cliente não paga a agência, a agência, por sua vez, não paga a produtora, e a Apro pergunta: afinal, o cliente é da produtora ou da agência?”, questiona Sonia Regina Piassa, diretora executiva da entidade.
A executiva alerta que poderá haver falências no setor . “Estão pagando depois que o filme entra no ar. Mas entre a produção e a filmagem podemos levar um mês. E aí, quando o comercial estreia, eles faturam a nota para 60 a 90 dias. Não dá. As equipes técnicas não estão querendo trabalhar deste jeito. Estamos vendo baixas na maioria dos filmes. As produtoras grandes têm equipe fixa e precisam pagar seus funcionários. E elas têm ficado com apenas 10 a 15% do orçamento por causa dos altos custos. É um efeito cascata que afeta a qualidade. A quantidade de comerciais produzidos hoje é menor e os maiores filmes são os piores para serem feitos. Quem não tiver estrutura e dinheiro em caixa vai quebrar”.
Segundo a mesma fonte, às vezes, um dia antes de vencer a fatura de pagamento, chega uma carta da empresa informando novo prazo. Representantes do mercado de produção carioca e de agências, inclusive, vão se reunir com o prefeito Eduardo Paes nesta segunda-feira (18), para negociar a diminuição dos custos de filmagem no Rio de Janeiro, como forma de estimular as produções na cidade.