“Muita gente pensa que por não ter mais concorrência, isso pode trazer comodismo, mas na verdade é o contrário. A gente sabe que está numa situação em que precisamos defender nossa posição”, conta Fernando Ligório, CEO do Grupo 4ZERO4, em bate papo com o Promoview sobre o novo modelo de contratação de agências do Grupo Heineken, que impressionou o mercado.
O fim das concorrências pode ter parecido uma utopia do mercado de live marketing anos atrás, mas em uma decisão corajosa do Grupo Heineken se tornou realidade. Em fevereiro, contamos aqui no Promoview que a marca optou pela contratação de três agências fixas para entregar as ações de experiência.
Nas redes sociais, a publicação gerou comentários como “é isso que dá consistência e longevidade nas ações” e “tomara que outras marcas sigam o mesmo caminho”, além de “esperança de mudança no nosso mercado”. Por outro lado, há afirmações que a concorrência é a “oportunidade para os pequenos conquistarem grandes marcas” e que a falta delas gera uma “mesmice” nas entregas.
Para entender melhor os bastidores dessa decisão da marca e como funcionará o novo formato, conversei com Fernando Ligório, CEO do Grupo4ZERO4. Ele fala em nome da Voe, agência de live marketing do grupo, que se tornou uma das agências fixas da Heineken.
De regional a estratégica: como a Voe se consolidou no ecossistema Heineken
A conquista do espaço entre as três agências fixas do Grupo Heineken não aconteceu da noite para o dia. A Voe iniciou sua trajetória como uma agência regional em Florianópolis, atendendo o sul do país. Na época, era uma das homologadas da Brasil Kirin — grupo adquirido posteriormente pela Heineken. “A gente é um sobrevivente de todo esse processo. Passamos por todas as aquisições e nos mantivemos relevantes”, conta Fernando Ligório.
A virada veio em 2018, quando a Voe decidiu abrir um escritório em São Paulo. O movimento visava justamente romper com a imagem de agência regional e entrar para o radar nacional. “Na época, a Heineken trabalhava com 14 ou 15 agências homologadas, e éramos vistos como parte desse quadrante regional. Com a operação em São Paulo, começamos a cavar nossos espaços em jobs que nos colocassem num novo patamar”.
Essa transição ganhou força com o avanço da área de brand experience da Heineken — hoje chamada de BEST, sigla para Brand Experience and Sponsorship Team. Para Fernando, a consolidação da Voe como uma das três agências fixas tem relação direta com a evolução dessa área dentro da companhia. Ao longo dos últimos anos, a agência foi conquistando entregas estratégicas e colhendo os frutos de um modelo mais saudável de relação.
“Antes, era job a job, todo ano uma nova concorrência. Aos poucos, fomos entrando em plataformas com contratos renováveis. Isso ajudou a construir o cenário atual”
Fernando Ligório, CEO do Grupo 4ZERO4
Como foi o “processo seletivo” das agências selecionadas
Questionado se houve uma concorrência final ou processo seletivo para as posições fixas, Fernando respondeu: “Teve, sim. Só que nós não estávamos sabendo (risos)”. Embora a Heineken não tenha feito uma concorrência oficial para a mudança de modelo, Fernando afirma que a escolha das três agências foi o resultado de um processo contínuo de avaliação de performance.
Eles avaliaram a partir do que a gente estava entregando quem eram as agências mais capazes dentro das expectativas da marca. Então foi uma seleção natural, como sempre é no mercado. Quem está ganhando mais concorrências, e também uma parte de relacionamento. Acredito que foi um mix de quem estava entregando melhor e tendo um bom relacionamento com as áreas.
Fernando Ligório, CEO do Grupo 4zero4
O que muda com agências fixas e o formato de fees
Como explicado em fevereiro, com contratos de três anos, as agências receberão um fee mensal correspondente a 80% do valor anual acordado, enquanto os 20% restantes serão pagos como success fee, atrelado ao desempenho e aos resultados obtidos. O formato anterior consistia em concorrências para cada projeto, com contratações job a job.
Para a Voe, estar nesse novo formato, com contrato fixo e remuneração por fee, representa um marco. “A gente acredita nesse modelo. Ele permite mais planejamento, mais investimento em estrutura e pessoal. É um modelo que qualifica a agência”, afirma. A agência já conta com uma equipe dedicada exclusivamente ao atendimento da marca.
A divisão dos trabalhos, em um primeiro anúncio, seria por meio de territórios, de forma que a Voe ficaria responsável por eventos cervejeiros e regionais. Fernando explica que há flexibilidade: que, na prática, há flexibilidade. “Eles nos colocaram em frentes como as cervejas craft e eventos regionais, mas já estamos atuando em outras plataformas também. Esses territórios funcionam como um norte, mas o dia a dia mostra que tudo está em movimento”.
O primeiro grande projeto da agência nessa nova fase será a plataforma de skate da Heineken 0.0. A Voe também está desenvolvendo toolkits para marcas como Blue Moon e Baden Baden, além de continuar atuando em frentes como a Parada do Orgulho LGBTQIAPN+ e festas regionais como a Oktoberfest.
E, afinal, comodidade gera comodismo?
Para o CEO do Grupo 4ZERO4, definitivamente não. Na verdade, a mudança traz uma responsabilidade a mais. “A régua continua alta. A diferença é que agora não precisamos gastar energia tentando adivinhar o que o cliente vai gostar. A gente já sabe o que funciona, o que está nos planos da marca e onde a gente pode ousar”, explica.
Questionado se havia alguma desvantagem no modelo de fees – ou vantagens do antigo modelo de job a job – Ligório afirmou que não e defendeu o formato como o futuro do mercado.
Eu acho que é um movimento inteligente e que pode ser que daqui a cinco anos pareça até óbvio. Alguém tinha que dar o primeiro passo, e a Heineken deu. Para mim não, em termos de mindset, não muda absolutamente nada assim, se comparar um modelo de de job a job de concorrência, sempre vamos querer entregar o melhor. Mas agora eu posso conhecer mais sobre sobre as marcas do grupo e aí consequentemente isso me dá ferramentas para entregar melhor, criativamente falando.
Fernando Ligório, CEO do Grupo 4ZERO4
Por fim, além de querer manter a posição alcançada, a agência deseja que o modelo dê certo e inspire outras marcas a aderirem. “Acreditamos que pode ser um divisor de águas. Isso aqui dando certo serve de exemplo para outros para outras empresas também que seguissem esse modelo. Acho que foi um movimento bem corajoso da Heineken e que a gente espera que seja um, que crie uma uma tendência aí no mercado”, conclui Fernando.