Quando olhamos o mercado de mídia, me parece existir um entendimento generalizado, como aquelas verdades tão óbvias que nem vale a pena serem discutidas, de que as mídias tradicionais – TV, rádio, jornal, revista, mídia exterior, etc – caminham para seu fim.
É comum se escutar que todos estes meios serão rapidamente substituídos por diferentes modelos e formatos pertencentes a uma única grande plataforma de meios on-line.
Esse entendimento não é surpreendente. Toda a novidade contundente costuma ser vista como aquilo que vai substituir completamente o modelo corrente. Além disso, é sempre mais fácil se posicionar de imediato projetando o domínio do “novo”, do que buscar um entendimento mais profundo e real do contexto dessa novidade.
Foi assim quando do anúncio da morte do rádio e do cinema por conta da popularização da TV; ou quando se decretou a falência dos comerciais de TV por conta do Tivo (primeira marca popular de gravadores de programas de TV); ou ainda quando se falou da extinção das lojas físicas por conta do surgimento do e-commerce.
Mas nada disso aconteceu.
Porém, mudanças ocorreram. E o que aconteceu, foi o que tipicamente acontece – não a morte, mas uma readequação das caraterísticas do serviço, da forma de atuar, tudo isso por conta de um mundo que se tornou diferente do que era.
As lojas físicas, por exemplo, terminada a febre da proclamação do seu juízo final, voltaram a ser vistas como fundamentais para varejistas, porém agora como um ponto de geração de experiência, experimentação, interação com clientes, e, até mesmo, ironicamente, como ponto de retirada e entrega de itens comprados on-line.
Hoje, até as empresas ícones do mundo tech – Apple, Amazon, Google – estão investindo nesse modelo antes dado como ultrapassado.
Mas se então as mídias off-line não irão desaparecer, qual o seu futuro?
A discussão sobre o tema, que raramente acontece sem a companhia constante da ideia que o fim está próximo, tem passado por alguns pontos.
Muito tem se falado, como disse Sir Martin Sorrell numa entrevista para a Folha de S.Paulo em 2016, que o caminho seria o de aumentar a relevância e a atuação das instituições e empresas que produzem métricas confiáveis sobre os veículos.
Também se comenta sobre o valor da padronização dessas métricas de audiência, ou ainda em reforçar a percepção da importância da publicidade off-line como o grande financiador do conteúdo de qualidade, tão fundamental para a sociedade.
No entanto, nenhuma dessas alternativas parece responder verdadeiramente à questão. Ainda em busca de um novo caminho, veículos acabam por acrescentar formatos de mídia on-line aos pacotes comerciais de mídia off-line, numa tentativa de torná-los mais contemporâneos e atrativos.
Pouco ou nada se fala, porém, a respeito de uma questão fundamental: o fato de que métricas de audiência – utilizadas hoje como critério central para escolha das ações de mídia de uma campanha – não permitem o entendimento da eficiência das ações, nem, consequentemente, a otimização dessas ações num próximo momento de compra de mídia.
Audiência não é tudo
As métricas disponíveis hoje dizem respeito à audiência dos veículos, que é a mesma para todos os anunciantes. Se estivessem apontando efetivamente a eficiência das campanhas, permitiriam a cada anunciante entender o resultado que cada um de seus esforços publicitários traz para o seu negócio especificamente.
Essa característica das mídias off-line – a ausência de métricas de eficiência – torna-se crítica quando a demanda e a expectativa por tal solução é maior a cada dia, e levando em consideração que já existe uma alternativa que entrega esse bem: a mídia online.
Os meios tradicionais continuam impactando uma massa de consumidores, assim como continuam a representar a grande maioria do investimento publicitário, tanto no Brasil como no mundo de uma forma geral.
Mas não vamos ignorar a realidade: durante todos esses anos, a mídia off-line se manteve parada no século passado. Ela continua sendo escolhida, comprada e entregue fundamentalmente da mesma maneira há décadas.
Analytics, o sonho de qualquer empresa que investe em publicidade
Em 1999, quando fazia parte do primeiro time de publicidade digital do País, vi o que era um meio publicitário entregando, pela primeira vez, métricas de eficiência de campanha, um sonho para qualquer gestor de marketing.
Já naquela época não foi difícil entender que eram os analytics o “detalhe” que fariam tudo mudar. Quase duas décadas depois, quando uma campanha é veiculada em um meio off-line, ao contrário do que acontece na mídia digital, nenhum dado novo é gerado.
Mas seria possível a mídia tradicional produzir analytics, assim como já acontece na mídia on-line?
Veja o exemplo da Tesla, a montadora de carros que está mudando o jogo da indústria automobilística. Se você estiver hoje dirigindo um Tesla e acreditar que seu carro não está performando como deveria (autonomia menor do que você imagina, por exemplo), você aperta um botão, acessa a central de atendimento e imediatamente seu carro faz o upload de todo um conjunto de dados.
Em instantes, a performance do seu carro é comparada com todos os outros carros que estão sendo dirigidos na mesma condição (temperatura externa, estilo de condução, etc) e então você é informado se realmente existe algo anômalo ou não. Isto são carros gerando dados.
No caso da Spalding, maior fabricante de bolas esportivas do mercado americano, a empresa foi a primeira a lançar uma bola de basquete com uma nova e intrigante funcionalidade: ela permite informar, em tempo real, sua aceleração e seu spin, assim como a distância e altura atingidas. São bolas gerando dados.
Ora, se carros e até bolas passam a ter a capacidade de gerar dados sobre sua performance em tempo real, porque as mídias off-line não teriam?
Observe que nem o carro nem a bola viraram bits, ou tiveram a sua natureza física, off-line, alterada em qualquer aspecto. Mas, ainda assim, eles passam a produzir bits de informação. Da mesma forma, a mídia off-line, que impacta diretamente o consumidor via uma tela de televisão, de cinema, outdoor, via o áudio de uma rádio ou, ainda, via as imagens de uma revista ou jornal, pode sim gerar dados sobre sua performance, sem estar obrigatoriamente conectada a dispositivos que acessem a internet ou permitam interação nativa, como celulares, tablets ou desktops.
Em outras palavras: a mídia off-line não precisa se transformar em mídia on-line para produzir dados de performance.
A tecnologia será, então, uma aliada para resolver a questão central que aflige a mídia off-line hoje: a sua incapacidade de gerar métricas que permitam, a cada anunciante, individualmente, o real entendimento dos resultados de suas ações, e dos caminhos para maximizar estes resultados.
Imagine o nível do resultado atingido por cada nova ação publicitária, em um meio off-line, quando se passa a entender com precisão quais mensagens geram maior engajamento, quais formatos, seções, programas, horários, o nível ideal de investimento, e assim por diante, de forma simples, direta e automática – exatamente nos mesmos moldes do que já é possível hoje nos investimentos online.
Embora essa não seja a discussão que ocorre hoje na indústria, a geração de analytics em meios off-line é sim possível, e os ganhos que se têm com seu uso fazem a diferença, não somente para os anunciantes, mas para todo o ecossistema: veículos, que passam a gerar muito mais resultado do que gerariam sem o uso de analytics, e agências, que conseguem entregar os resultados que seus clientes tanto esperam, de forma muito mais tangível e contundente.
Assim como as lojas físicas, o cinema ou o rádio, a mídia off-line não vai morrer. Ela continuar existindo, porém com uma transformação central na forma como é medida – por sua capacidade de gerar dados reais, precisos e relevantes sobre a eficiência de suas campanhas.
Ainda que a comercialização da publicidade off-line tenha parado no tempo, ela não precisa se manter no passado. Este é o momento para entendermos o que a Tesla e a Spalding já entenderam em suas indústrias: que as ações de comunicação em meios off-line, que representam mais de 3/4 do investimento publicitário no mundo, também podem – e devem – gerar dados sobre sua performance.
Chegou a hora de trazermos a mídia tradicional para o século XXI.