Em pleno 2024, discutir a presença feminina no mercado de trabalho parece trivial. As mulheres representam 44% da força de trabalho do Brasil, de acordo com os últimos dados da Pnad Contínua do IBGE. Todavia, a remuneração obtida no trabalho é até 20% menor em relação aos homens e, analogamente, ocupam menos cargos de liderança.
A discrepância é ainda maior em setores masculinizados. As mulheres ocuparam apenas 12,3% do mercado de tecnologia, segundo os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), no período de 2015 a 2022. Isso acontece, entre outros motivos, pela falta de incentivo e referências às meninas para que elas busquem uma especialização e carreira no ramo.
Por outro lado, a participação feminina aumentou 60% no setor nesse mesmo período. Para a diretora de ESG e EHS da ODATA, Carolina Maestri, esse aumento se dá por meio de políticas afirmativas que incentivam o recrutamento de mulheres. “Outro fator importante são as lideranças femininas do setor, que promovem programas de apoio, mentoria e incentivo às outras profissionais. Atualmente, há também ONGs voltados à capacitação de mulheres no setor de tecnologia”, explica a diretora.
Agenda ESG
Juntamente com às medidas afirmativas, as empresas, hoje, já sabem que a equidade de gênero é indispensável para se destacar. Este é um dos objetivos de desenvolvimento sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU) e faz parte da agenda ESG dos negócios.
“A presença de mulheres em cargos de liderança é fundamental para as organizações, sobretudo na indústria de tecnologia. Estudos têm consistentemente demonstrado que empresas com maior diversidade de gênero em suas lideranças tendem a alcançar maior sucesso e inovação, enquanto também promovem ambientes de trabalho mais inclusivos e colaborativos”, afirma Caroline Raimundo, Diretora de Marketing Latam da Acer.
A Acer foi reconhecida como uma das Principais Empresas do Mundo para Mulheres em 2023, pelo segundo ano consecutivo. Em 2022, as mulheres representavam 38% da força de trabalho total e 31% dos cargos de liderança da empresa.
Outra empresa de tecnologia que possui um posicionamento claro de ESG é a Tim Brasil. Mais de 35% das colaboradoras ocupam posições de liderança. Desde 2021, a marca lidera também o movimento Mulheres Positivas, ecossistema com mais de 180 empresas engajadas com a empregabilidade e a capacitação de mulheres na sociedade.
“Acredito que a diversidade de perspectivas e experiências femininas desempenha um papel fundamental dentro da TIM. A diversidade de gênero não só impulsiona a inovação, mas também fortalece a conexão emocional e a fidelidade dos clientes à marca”, afirma a CIO na TIM Brasil, Auana Mattar.
A equidade é, também, uma oportunidade
Além da grande fração do mercado de trabalho ocupado por mulheres, elas também estão na outra ponta: são consumidoras. De acordo com os dados do Pnad (2022), as mulheres, que representam 51% da população brasileira, são responsáveis pelas compras em 96% dos lares. Dessa forma, a presença feminina dentro do processo de tomada de decisão é indispensável para o sucesso de uma marca.
“Sabe aquele ditado popular, cada um sabe onde o calo aperta? Pois bem, é aí que entra a importância da diversidade nas empresas. Quanto mais conhecimento de causa, maior a possibilidade de desenvolver soluções e produtos que realmente resolvam as dores dos consumidores”, diz a head de Estratégias da Rocket Lab no Brasil, Fernanda Faria.
A adtech que atua no segmento de marketing para o crescimento de usuários de aplicativos possui o projeto Círculo de Mulheres. A iniciativa, que pode ser replicada em outros empreendimentos, foca especialmente no desenvolvimento das mulheres da empresa.
“Fazemos encontros regulares entre todas as mulheres do time a nível global, nos quais trabalhamos temas como autoconfiança, comunicação não-violenta, trabalho em equipe, autoestima, entre outros. No final de cada ciclo, as mulheres de cada país propõem projetos que beneficiam seus times locais ou projetos externos que beneficiam a sociedade”, conta Fernanda Faria.
No universo de IAs, a diversidade é obrigatória
Em 2020, o documentário da Netflix Coded Bias trouxe à tona uma discussão: a tecnologia é machista? A pesquisadora Joy Buolamwini, do MIT, descobriu falhas na tecnologia de reconhecimento facial que mostravam que os algoritmos são enviesados. Atualmente, esse debate é ainda mais necessário, tendo em vista o crescimento exponencial das inteligências artificiais (IAs).
“Vejo que as IAs e outras tecnologias podem reproduzir preconceitos, já que são implementadas e treinadas com conjuntos de dados que refletem os preconceitos existentes na sociedade. Como sociedade temos muito a evoluir em termos de inclusão. Da mesma forma, é crucial incorporar diferentes perspectivas no processo de desenvolvimento dessas tecnologias“, diz Fernanda Faria, da Rocket Lab.
Para a CIO da Tim Brasil, o elemento humano é uma chave indispensável para o futuro do mercado: “A tecnologia avançou muito nos últimos anos, e de forma cada vez mais acelerada. Mas, mesmo diante das novidades que vimos nos últimos meses, com o boom de GenAI, novos modelos de chips e a velocidade da robótica, ainda vejo a necessidade da inteligência humana por trás das decisões. Entendo que é pré-requisito a diversidade e inclusão nestes ciclos de inovação. Estamos criando um mundo para todas as pessoas. A ausência de pessoas significa produtos e modelos incompletos ou enviesados”.