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Solucionismo ou Revolução?

Estamos vivendo um momento de transição, o começo de uma nova transformação no mercado de trabalho, e na sociedade como um todo, ocasionada pela rápida evolução da tecnologia de inteligência artificial.


Thoran Rodrigues

Nos círculos de tecnologia, existe um termo muito interessante, o “solucionismo”. Solucionismo é a atitude de colocar uma tecnologia nova como solução para todo e qualquer problema da humanidade, o que é equivalente a dizer que aquela inovação é, no fundo, uma solução em busca de um problema a ser resolvido, e não uma solução real para um problema concreto. Atualmente, estamos vivendo uma onda de solucionismo com as tecnologias de inteligência artificial.

Não devemos minimizar o impacto das inovações recentes nessa área. A inteligência artificial, e especialmente modelos mais recentes como o ChatGPT, é o que as pessoas chamam de uma “tecnologia fundamental”, algo que tem o potencial de impactar praticamente todas as áreas da sociedade. O fato de podermos aplicar IA em um problema, no entanto, não significa que devemos fazer isso. Os microprocessadores e a internet também são tecnologias fundamentais, mas ninguém precisa de uma máquina de espremer suco inteligente e online.

A melhor forma de pensar na evolução da tecnologia de inteligência artificial é fazer uma analogia com a revolução industrial. Nela, começamos a criar máquinas capazes de fazer, de forma mais rápida e mais barata, alguns tipos de trabalho manual, como apertar parafusos. 

Ao longo do tempo, novos tipos de máquinas foram sendo lançadas, com a capacidade de realizar outros tipos de trabalho. Gradativamente, tivemos uma automação do trabalho manual, e a substituição de pessoas por máquinas. Com a IA, vamos ver exatamente o mesmo movimento, mas ao invés do trabalho manual, o que está sendo automatizado é o trabalho com o conhecimento.

Assim como aconteceu com as máquinas tradicionais, a evolução vai ser gradual, e vamos ver novos tipos de máquinas – novos algoritmos e abordagens tecnológicas – surgindo para fazer novos tipos de trabalho. E, assim como o trabalho manual, mesmo nas fábricas, não desapareceu, o trabalho com conhecimento também não vai sumir. Sempre vão existir áreas onde a intervenção manual vai ser necessária ou valorizada, e onde o custo de automação vai ser proibitivo. Diferente do que é promulgado amplamente, a IA não vai “comer o mundo” de uma hora para outra.

Se a inteligência artificial não vai resolver todos os problemas da humanidade, qual é o seu papel na sociedade então? Assim como outras tecnologias, ela é uma ferramenta. Ferramentas tradicionais, como martelos e chaves de fenda, nos ajudam a trabalhar com objetos físicos. As diferentes IAs, por sua vez, manipulam informação, como texto, imagens, vídeo, nos ajudando a trabalhar com o conhecimento. Seu papel, portanto, é simplificar e acelerar esse tipo de trabalho.

No momento, a capacidade de atuação da tecnologia sobre o conhecimento é limitada. Os chamados “modelos generativos”, que são a base para o ChatGPT e praticamente todas as outras IAs que estão no mercado hoje, tem como capacidade central a produção de conteúdo. Eles são capazes de, a partir de um pedido por escrito, gerar um texto, uma imagem, um vídeo, um código de computador, ou algum outro tipo de conteúdo em linha com o que foi solicitado, e similar ao que seria produzido por uma pessoa. Eles aceleram a produção de conteúdo, mas dependem de um pedido bem estruturado, e, assim como as pessoas, cometem erros de todos os tipos.

Estamos vivendo um momento de transição, o começo de uma nova transformação no mercado de trabalho, e na sociedade como um todo, ocasionada pela rápida evolução da tecnologia de inteligência artificial. A tendência natural é reagirmos com medo, resistindo a qualquer mudança, ou com negacionismo, dizendo que nunca vamos ser afetados. Nenhuma das duas posturas é eficiente. O melhor a fazer é experimentar a tecnologia, para começar a entender o que ela pode – e não pode – fazer, e como essas novas ferramentas podem ajudar o seu dia-a-dia. Fazer parte do processo de mudança é sempre uma estratégia vencedora.

*Thoran Rodrigues, CEO da BigDataCorp