– Acho impressionante! Eles resolvem ir embora da agência às 19h, e vão!
Assim que comecei a conversa com o sócio de uma conceituada agência há alguns meses. Ele reclamava dos jovens que estagiavam ou iniciavam a carreira na sua agência. Dizia que não vestiam a camisa como os demais, que era só o relógio marcar 19h e iriam embora felizes, porta afora.
Lembro de ter perguntado se o problema era a hora de sair, ou se o fato de existir felicidade porta afora. A resposta é que ambos se complementam, já que não via os olhos destes jovens brilharem pela profissão quanto o dos mais velhos – vide eu, com 35 anos. Concordei. Para muitos deles, os olhos não brilham, mesmo. Alias, jovens, velhos, etc e etc.
Vivo com jovens, já que também ministro aula em graduação. É evidente o quanto os alunos de publicidade sonham menos em estar em agência, sejam elas de live marketing, publicidade, digital, etc. Sinal dos tempos, já que muitos buscam empreender, ou empresas que lhes deem mais tempo para curtir a vida porta afora.
Sou doido por agência. Amo o que faço. Tenho prazer monumental em criar projetos, planejar processos e ver key visuals surgindo. Mas entendo estes jovens, e digo que muitas vezes concordo com eles. Ser feliz na agência é ótimo, mas ter a possibilidade da ser feliz fora delas também é.
Lembro que resolvi empreender por vários motivos, mas um deles era para ter a oportunidade de ser multi. Poder dar aulas, palestrar, escrever livros, etc. Para isso, precisaria ter minhas noites e meus finais de semana livres. Entre outros, este foi o motivo que resolvi criar a minha agência, onde poderia sair no horário que considero bacana para mim – e para os funcionários que lá estão. Pois bem: os jovens buscam o mesmo. Acho que os mais velhos, também.
O romantismo de virar noites cada vez é menos romântico, sinto. Certa vez fiz um freela para uma grande agência de publicidade. Lembro que a concorrência era importantíssima, então naquele dia viraríamos a noite – era necessário. Engraçado foi notar que, mesmo sabendo que viraríamos a noite, a equipe resolveu ir jantar numa pizzaria em meio a vinhos. Duas horas na pizzaria, duas horas a mais na agência, duas horas menos em casa. Para eles parecia algo lindo, para mim, algo incompreensível.
Para os jovens de hoje, noto que este glamour da vida em agência não mais existe, ou não como antes. Se eu sonhava atuar em grandes agências, hoje o mundo é um pouco diferente. Ano a ano, noto que estes jovens buscam menos a elas. Anos atrás, os que atuavam em grandes agências gritavam o fato com orgulho, hoje, com serenidade de quem sabe que agências oferecem momentos deliciosos, mas também difíceis.
Alunos que atuam em agência chegam sempre atrasados nas minhas aulas, os que estão em empresas, sejam de fundo de quintal ou multinacionais, estão sempre em sala na hora marcada. O atraso destes primeiros não chateia a mim pelo atraso em si, mas por ver que estão ainda jovens neste mundo doido que ajudamos a criar. Por que as empresas conseguem que vivam depois das 19h, e parte das agências, não? Claro que são trabalhos diferentes, processos diferentes e dificuldade diferentes. Eu sei.
Mas também sei que se não (re)pensarmos agora o que estamos exigindo de todos nós, possivelmente muito em breve repensaremos sobre nós mesmos.