Experiência de Marca

A Filha Do Vento

Um encontro com Adria Santos, a atleta brasileira na Paraolimpíadas.

Luiz Fernando Coelho é Jornalista. Tem MBA em Marketing pela PUC-RJ. Atuou em grandes empresas na área de marketing. Sua última participação corporativa foi no Bradesco, tendo atuação importante no marketing do esporte (Projeto BCN/FINASA OSASCO, OLIMPÍADAS RIO 2016). Nos Jogos do Rio, criou a CASA DO VÔLEI, para a Federação Internacional de Vôlei. É voluntário da SOU DO ESPORTE na área de planejamento de marketing.

 

Os Jogos Paralímpicos – Tóquio 2020, começam agora.

O Brasil é uma das principais forças, graças a um trabalho iniciado há algum tempo, pelo meu amigo, Andrew Parsons, e que culminou no Parapan-Toronto 2015.  

Ficamos com a primeira colocação no ranking de medalhas, batendo o nosso recorde, com uma atuação fantástica dos nossos atletas.

E foi em Toronto que conheci Adria Santos, a atleta brasileira que mais havia ganho medalhas em Paraolimpíadas.

A princípio, fiquei meio desconfortável, pois ela foi apresentada como a hostess do grupo.  Como isso ia funcionar; termos uma pessoa, a nos guiar, cega?

Pois bem. O que eu não vi, foi a dimensão do que ela podia ensinar. Adria nos mostrou, além das competições, o que significava, para uma atleta, as competições do para desporto e como superar limites.

Adria Rocha Santos, nasceu em Nanuque, Minas Gerais, no dia 11 de agosto. 

É uma atleta velocista, especializada nas corridas de 100, 200 e 400 metros rasos. De acordo com o CPB – Comitê Paralímpico Brasileiro, a maior medalhista do Brasil.

Ela perdeu totalmente a visão devido à retinose pigmentar, e do astigmatismo congênito, em 1994.

Começou sua carreira em 1987, com 13 anos, numa escola para deficientes visuais, em Belo Horizonte.

O tempo ia passando e Adria, conquistando o pódio. Foram 13 medalhas em Paralimpíadas, 4 de ouro, 8 de prata e uma de bronze.  São cerca de 73 medalhas em provas internacionais e 542 em provas nacionais, na sua classe T11 (cegueira total).

A Filha do Vento. 

Seus melhores tempos: nos 100 metros, 12:34; nos 200, 24:99; e nos 400, 57:46. 

Voltando a Toronto e à visão de nossa hostess.

Ah! Sim, não se preocupem em falar que ela é cega, ou que o outro não tem uma perna: os atletas paralímpicos lidam com isso, muito bem. O problema está em nós, que não gostamos nem de ouvir falar em patrocinar pessoas com deficiência.

Adria me fez ver que, superar questões físicas, é muito simples.  Basta acreditar que é possível.

Fomos ver o futebol de sete, uma modalidade onde os atletas têm deficiências variadas, mas não são cegos.

 Nós nos sentamos, e ela me fez uma única pergunta: de que lado, o Brasil faz gol?” A partir daí ela conseguia torcer e vibrar, como qualquer um. Ela via o jogo através dos seus outros sentidos.

Em outra oportunidade a encontrei no saguão do hotel. Toda feliz. Serelepe, como sempre. Quando me percebeu, me disse: “Fui ao aquário de Toronto. Achei tudo muito lindo. Uma maravilha. Você deveria ir.” E eu fiquei imaginando como uma pessoa privada de sua visão poderia fazer uma afirmação daquelas.

Mas a cena que mais me chamou a atenção foi quando fomos ver as provas de atletismo. Era a primeira vez que Adria entrava numa instalação paralímpica de atletismo.

Durou muito pouco a sua estada lá. Ela começou a passar mal. Muito agitada.  Visivelmente emocionada. Começaram dores de cabeça.

Conseguimos um médico para vê-la. Mas não deu tempo: ela saiu do recinto rapidamente. Voltou para o hotel. Depois me confidenciou que não passou bem por causa da comida. Bobagem. Ela sentiu uma saudade enorme de estar na pista.

Passaram 3 ou 4 meses, estou eu, sentado no Aeroporto Santos Dumont, e vejo Adria e sua filha Bárbara, se aproximarem. Fiz um sinal à Bárbara para que ela não me denunciasse. Me coloquei no caminho que Adria estava percorrendo. Pois, ao estar a um palmo de mim, Adria parou bruscamente. Exatamente à minha frente. Colocou a mão no meu rosto e disse:   Oi Luiz. Você está por aqui?

Impressionante. Convivi com esta mulher durante 5 ou 6 dias, assistindo aos jogos, e ela, colocando sua mão em minha face, consegue ver quem está à sua frente! Impressionante.

Voltando às Paralimpíadas. Falei com ela há poucos dias e perguntei: e aí Adria? Deu muita palestra para os atletas que estão indo para Tóquio? Passou sua experiência para os mais jovens? Passou, um dia, nos treinos do atletismo? Afinal, a experiência de uma atleta como você ajudaria muito a quem vai para uma paralimpíada pela primeira ou segunda vez.

Resposta de Adria: “não”. Pura e seca. 

Eu fico imaginando, como nós realmente pensamos pequeno. Um exemplo de vida e luta como este, guardado em casa. Sem dividir sua experiência. Que fantástica experiência não estamos compartilhando.

Mas é o tal pensamento mesquinho; o tal complexo de vira-lata; a tal da história de que o que eu faço é melhor do que o que foi feito, sempre. 

Mas um fato importante aconteceu. Ela foi convidada para comentar a abertura dos jogos que serão transmitidos pela televisão.

“Estou muito feliz com essa oportunidade e mais ainda pela representatividade que ela significa no mundo das pessoas com deficiência. A ocupação de espaços por pessoas cegas ou com outro tipo de deficiência não é só sinônimo de inclusão, mas de quebra de paradigmas, inovação, diversidade e igualdade. Fico feliz de fazer parte dessa experiência e de ter o reconhecimento da emissora”.

Adria representou o Brasil por 27 anos. Hoje, mora em Joinville, Santa Catarina.

Parabéns, Adria Santos, a Filha do Vento, por tudo o que você nos faz enxergar representando nosso país. 

Que venham as Paralimpíadas Tóquio 2020