A minha fascinação pelo esporte se dá principalmente no momento em que se pensam as ações a serem implantadas, planejam-se diferentes possibilidades de ativação e realizam-se os projetos, muitas vezes muito criativos, outras nem tanto, mas tudo completamente adequado ao que se espera para trazer os fãs o mais próximo possível. Genuinamente, um trabalho de pesquisa e construção, com um resultado genial.
Talvez inspirada nos carnavalescos que, ao desenvolverem seus enredos, precisam fazer inúmeras pesquisas para então colocar de pé a história que aquela agremiação vai contar, a Umbro foi buscar uma belíssima e verdadeira história para confeccionar as novas camisas do Sport Clube Recife.
Não estou aqui para fazer propaganda de uma empresa que confecciona uniformes, muito menos tentando aliciar meus leitores para torcer pelo Sport. Nada disso. Sou carioca, torço para um time do Rio, apesar das inúmeras tentativas de me fazerem, pelo menos, ser simpatizante de algum clube por aqui. Todas as vezes que sou pressionado a dizer que acho este ou aquele time mais bacana, respondo com uma frase que ouvi num desses bares, onde se toma chope garotinho, beliscando uma batata frita ou um ovo cor de rosa: “Olha, a gente troca de mulher, de sexo, de religião, mas de time do coração, jamais!” Achei a frase fantástica, principalmente pela lógica do torcedor que ela nos traz.
Uma pequena pausa, pois preciso falar de Ariano Suassuna.
Ariano Suassuna (1927- 2014), escritor brasileiro que tem em “O Auto da Compadecida” sua obra-prima, que foi adaptada para a televisão e para o cinema. Sua obra reúne, além da capacidade imaginativa, seus conhecimentos sobre o folclore nordestino.
Intelectual, escritor, teórico da arte, dramaturgo, romancista, ensaísta, poeta, artista plástico, professor, advogado e palestrante, Suassuna foi um dos maiores pensadores da nossa história, e em 1989 foi eleito para a cadeira nº 32 da Academia Brasileira de Letras.
São inúmeras obras onde o folclore e a cultura do nordeste brasileiro são retratados de maneira magistral. Ariano também atuou nas secretarias de cultura de alguns governos, trazendo sempre um olhar diferenciado e iniciativas inovadoras para a cultura. Uma figura extraordinária que tinha no SPORT CLUB RECIFE uma de suas grandes paixões.
Pois bem, os designers da Umbro, incumbidos de desenhar a nova camisa do Sport, foram buscar um fato ocorrido com um ilustre torcedor: Ariano Suassuna. Torcedor fanático do Sport Club Recife, estava em Portugal para receber uma homenagem do então presidente Mário Soares. Para não fazer feio, Suassuna perguntou qual seria o traje que deveria usar na referida cerimônia. (Em tempo, para aqueles que não são muito familiarizados com futebol, o Sport Recife tem as cores vermelha e preta estampadas em sua camisa.) Ele obteve uma resposta, que deixou sua imaginação livre – aliás, o que nunca lhe faltou: “Venha com o traje esporte fino.”
Pois bem, nossa personalidade então aproveitou a oportunidade e vestiu o traje que mais gostava de usar: camisa social vermelha, paletó preto. Em seu gosto pessoal, aquele era sem dúvida o tal esporte fino. Essa vestimenta, esse traje ganhou, então, de Suassuna o apelido de SPORT FINO. Nada como uma visão romântica do futebol, em que o torcedor assume o protagonismo de transformar suas ideias em verdadeiras preciosidades criativas, tornando aquilo um símbolo maravilhoso e histórico.
A Umbro sacou essa ideia e transformou o uniforme da equipe numa versão futebolística do esporte fino de seu ilustre torcedor, e é claro que batizou a nova coleção de uniformes de Sport Fino. Além das cores, a numeração das camisas conta com invocações aos desenhos de Suassuna, e o fundo da camisa traz ícones que remetem ao artista. Muitos detalhes que demonstram toda a paixão que ele tinha pelo seu clube de coração, incluindo-se aí a frase cunhada por ele: “Felicidade é torcer pelo Sport.”
O marketing do esporte ganha, assim, um case espetacular. Simples e absolutamente em harmonia com o que significa ser apaixonado por futebol e torcer por um clube.
Dizer a todos que futebol também é cultura faz com que os mais puristas estremeçam em suas covas ou onde estiverem, para mim não importa. Mas vejam se não concordam comigo: será que a nova camisa do Sport Recife, desenhada para celebrar um torcedor fanático, famoso e dos mais ilustres, não cria a possibilidade de levar alguns brasileiros a conhecer Ariano Suassuna?
Quando venho aqui defender conceitos, valores, atitudes para o marketing do esporte, estou tentando passar a todos exatamente isso, que algum ou alguns seres humanos brilhantes tiveram fantástico insight, colocaram no papel e viabilizaram. Por isso, até mudei o tema do artigo desta semana para render minhas homenagens aos autores da ideia, àqueles que a aprovaram e à UMBRO, que, como multinacional de equipamentos esportivos, topou o desafio de produzir uma terceira camisa, de uma equipe que tem uma enorme representatividade em nosso país, e que certamente vai fazer com que os colecionadores adquiram pelo menos uma para seu acervo.
Inspiradora essa ação, mostrando a todos que sempre existe uma nova possibilidade para o desenvolvimento de ações capazes de trazer novos conceitos de atuação no futebol, no esporte. Só espero que nenhum atleta, em momento de total falta de respeito com as cores que defende e, no caso, com nosso Ariano Suassuna, não se ache mais importante do que qualquer ser e, ao marcar um gol, por exemplo, não arranque a camisa e a jogue para qualquer lugar.
Se não for por respeito ao Sport, pelo menos por precaução para que os mortos não venham puxar seus pés, durante a noite.
Cinco frases famosas do grande Suassuna
- Não troco o meu ‘oxente’ pelo ‘ok’ de ninguém!
- Tudo que é bom de passar é ruim de contar. E tudo que é ruim de passar é bom de contar.
- Eu divido a humanidade em duas metades: de um lado os que gostam de mim e concordam comigo. Do outro, os equivocados.
- É tanta qualidade que exigem para dar emprego, que não conheço um patrão com condições de ser empregado.
- A tarefa de viver é dura, mas fascinante.