Gosto de esportes… Apesar de não praticar nenhum, pois apenas faço minha rotina diária de exercícios, como todo mundo que quer viver muito e bem consigo mesmo!
Porém, assisto muito esporte: com assiduidade futebol (óbvio para nós brasileiros), vôlei, tênis e basquete apenas nos playoffs da NBA.
Nesta temporada 18/19 da NBA, o Toronto Raptors foi o campeão. Um time canadense vence o campeonato pela primeira vez, desde a criação da Liga, em 1946!
Apesar do Canadá fazer parte da NBA desde a sua fundação, o país não tem grandes times comparando-se com os americanos, haja visto que tem o hóquei como um dos principais esportes do país.
Logo após a vitória do Toronto Raptors, li um texto excelente do Denis Botana, que escreve para o Bola Presa, especializado em NBA. Ele explicou como o time chegou lá e gostaria de dividir com vocês o conteúdo aqui, não só por gostar do jogo e ter acompanhado os 14 últimos jogos dos 2 finalistas, mas pelas lições do Toronto a quem empreende…
Vamos lá!
“Em 1995, o time recém-criado participou do chamado Draft de Expansão, um recrutamento em que as novas franquias da Liga poderiam selecionar alguns nomes de outras equipes para formar seu plantel. Os Raptors selecionaram BJ Armstrong, armador do Chicago Bulls, mas o jogador simplesmente se recusou a se apresentar no Canadá. Restou ao time negociá-lo com o Golden State Warriors por outros atletas.
Ao longo das próximas décadas, vimos outros grandes nomes irem para Toronto, ganharem a torcida e eventualmente decidirem ir embora daquela terra estranha, fria e que nem gostava tanto assim de basquete.
A coisa começou a mudar em 2009, com a chegada de DeMar DeRozan, e, em 2012, quando o time trouxe o armador Kyle Lowry. Aos poucos a dupla formou uma amizade intensa fora da quadra e um entrosamento impecável dentro dela, levando os Raptors a seus voos mais altos de sua história nos playoffs. Sem espaço para ser titular no começo da carreira, Lowry viu em Toronto a primeira franquia a dar a ele as chaves do time. DeRozan chegou ao Canadá com 19 anos e virou adulto na cidade, um lugar que ao longo dos anos finalmente pegou gosto pelo esporte e idolatrava o ala. Os imigrantes da cidade cosmopolita abraçaram o Toronto Raptors e o basquete como seu esporte, superando o confuso hóquei sobre o gelo que tanto fascina os locais. Foi um caminho bem mais longo e árduo e onde muita gente achou que o esporte não ia pegar no país. Levar jogadores para o Canadá, acreditem, era tarefa pesada.
A história mostra como nunca foi fácil para o Toronto Raptors atrair grandes estrelas. Jogadores em fim de contrato nunca cogitaram mudar para lá e empresários sempre alertaram sobre os riscos de trocar por atletas que depois não renovariam seus vínculos. Até a famosa estratégia do tanking – onde o time é ruim de propósito por um ou dois anos para se posicionar melhor no draft de novatos – nunca foi adotada de verdade por lá. Havia o medo de alienar ainda mais a torcida. Como então montar um time campeão? Os Raptors tiveram de comer pelas beiradas. Coube à franquia selecionar os jogadores certos em posições baixas no draft, trabalhar internamente seu desenvolvimento, fazer trocas pontuais e eventualmente até arriscar por jogadores que diziam não querer ir para lá. Veja abaixo como o time adquiriu os principais jogadores responsáveis pelo título da temporada 2018/19:
Kawhi Leonard – O MVP das Finais da NBA chegou em uma troca que chocou todo ser humano na Terra que se importa com basquete antes desta temporada. DeMar DeRozan, a primeira estrela a dizer que queria ficar em Toronto para sempre, foi chutada para o San Antonio Spurs em nome de Kawhi Leonard. O ala vinha de uma lesão grave, misteriosa, tinha passado um ano sem jogar e deixou bem claro que não queria jogar no Canadá. O time topou o risco.
Kyle Lowry – Depois de sete temporadas como reserva no Memphis Grizzlies e no Houston Rockets, o Toronto Raptors decidiu apostar no potencial do armador que volta e meia brilhava quando tinha uma chance. Muitos viam Lowry como alguém muito lento e pouco atlético para a posição e seu arremesso de longa distância era fraco e irregular antes de ir para Toronto. Um caso raro de alguém que deslancha a partir dos 26 anos.
Pascal Siakam – O camaronês começou a jogar basquete só aos 15 anos e chamou a atenção do jogador da NBA Luc Mbah a Moute, que comanda um camp de basquete no país. Pouco depois ele foi para os EUA, conseguiu bolsa na Universidade de New Mexico State e foi selecionado pelos Raptors apenas na 27ª posição do draft de 2016. Com muito poder físico, mas ainda muito afobado e desengonçado, ele foi esnobado por muita gente até cair nas mãos dos Raptors. É mais um projeto de jogador que virou o que virou graças ao trabalho interno do time para desenvolver seus atletas….
Marc Gasol – Um dos grandes pivôs desta década, depois de muitos anos de sucesso, prêmios e All-Star Games, foi trocado no meio desta temporada por 3 jogadores dos Raptors, que decidiram arriscar e trocá-los por Gasol, de 34 anos, mas com talento e experiência de playoff.
Danny Green – O ala veio ao lado de Kawhi Leonard na troca com o San Antonio Spurs. Danny Green quase que ficou sem vaga na NBA depois de começar mal a carreira no Cleveland Cavaliers e melhorar nos Spurs.
Fred Van Vleet – O principal reserva do time campeão se inscreveu no draft de 2016 e não foi escolhido por nenhum time. Ele conseguiu uma vaga para treinar com os Raptors antes da temporada 2016-17 e precisou bater diversos concorrentes pela décima quinta e última vaga no elenco que iria disputar aquela temporada.
Serge Ibaka – Para adquirir Serge Ibaka o Toronto Raptors precisou mandar o arremessador Terrence Ross (e uma escolha do time no então futuro draft de 2017 para o Orlando Magic. O ala/pivô estava chegando ao fim do seu contrato, que foi renovado com os Raptors. Ibaka vivia seu pior momento na carreira no time da Flórida, mas voltou a se destacar quando embalou nos Raptors.
Norman Powell – O último jogador da rotação regular dos Raptors nos playoffs foi escolhido apenas no posição 46 do draft de 2015. Ele é outro nome que só virou o que virou após muito tempo de treino e jogo no 905, time da liga de desenvolvimento afiliado ao Raptors.
Nick Nurse – O técnico de 51 anos se sagrou campeão em sua temporada de estreia na NBA, mas ele está na estrada do basquete há muito tempo. Nurse conseguiu seu primeiro trabalho como técnico aos 23 anos na Universidade de Northern Iowa, se tornando assim o treinador universitário mais jovem do país. Depois ele passou por outras faculdades e ficou 11 anos na liga britânica de basquete, onde atuou até como jogador-técnico. Ele voltou para os EUA só em 2001 para treinar em ligas profissionais minúsculas e depois na G-League, a liga de desenvolvimento da NBA, onde foi eleito o técnico do ano pelo Rio Grande Valley Vipers, afiliado do Houston Rockets. De lá ele foi contratado para ser assistente no Toronto Raptors e assumiu o cargo principal em 2018.
Masai Ujiri – Responsável por todas as decisões citadas aqui que montaram o time campeão, Masai Ujiri tem uma das histórias mais improváveis da NBA. Jogador de pouquíssimo sucesso na Europa quando jovem, ele simplesmente acompanhava um atleta nigeriano em um treino pré-draft no Orlando Magic no começo deste século quando chamou a atenção do então técnico Doc Rivers em um papo descontraído sobre basquete. Foi contratado como um olheiro não remunerado pela franquia. Seu conhecimento e excelente capacidade de se comunicar e fazer contatos o tornou olheiro (agora com salário) para o Denver Nuggets na Europa. Alguns anos depois e ele foi contratado para ser Diretor Global de Scout do Toronto Raptors. A carreira então deslanchou: virou assistente de General Manager no próprio Raptors, depois General Manager principal dos Nuggets e finalmente retornou para o Canadá em 2013 para ser o chefão da coisa toda. Filho de nigerianos e nascido na Inglaterra, Ujiri é o único não-americano a já ter vencido o troféu de Executivo do Ano na NBA.
Padrão Raptors
Deu para sentir um padrão, não deu? Kyle Lowry, Fred VanVleet, Norman Powell e Pascal Siakam todos chegaram ao time sem muita expectativa e todos se tornaram lá dentro as suas melhores versões. E tirando Lowry, todos passaram pelo perrengue de ganhar seu espaço aos poucos, precisando até gastar muito tempo na G-League. Muitos times ignoram a Liga de Desenvolvimento e é comum jogadores encararem a ida ao campeonato como um sinal de desprezo das equipes. Para os Raptors funcionou tanto que até seu técnico foi formado lá.”
Bom para o Toronto Raptors mas e eu com isso?
Na hora pensei no meu desafio de conseguir gente boa para uma empresa pequena, que paga pouco, não tem nome, benefícios, mas que precisa de gente com brilho no olho, que trabalhe muito e que tenha ambição de crescer e ser dono de negócio, não apenas executando o que é mandado, mas agregando em todas as etapas do processo e da empresa…
Quais as lições que aprendi com o Toronto?
- Planejamento de longo prazo – definir metas a cada ano, visando uma visão maior para 5, 10 anos.
- Autoconhecimento do negócio – qual a sua estrutura ideal/possível, suas fraquezas, lacunas e como preenchê-las.
- Gente, gente, gente – que tipo específico de pessoas são necessárias em cada caixa?
- Ter a missão do negócio disseminada por todos internamente – um time que defende sua marca/camisa.
- Ser criativo – como buscar as pessoas certas tendo limitações de recursos? Fontes alternativas de recrutamento, funções híbridas, formas inéditas de remuneração/participação.
- Correr riscos – às vezes abrir mão de pessoas e “oportunidades” em prol do plano maior.
- Dar/exercer autonomia.
- Compromisso, senso de equipe.
- Bom humor.
- Estar preparado para vencer, aproveitando a deixa do adversário.
Estou tentando pôr tudo isso em prática… e você?
Por Flavia Rocha.