Pix de R$ 0,01

Especialista diz que campanha de PIX do Burger King pode ferir a LGPD; empresa ressalta segurança e expande ação

O advogado Alexander Coelho afirma que possível violação à lei depende de consentimento prévio e tratamento de dados; empresa se defende

Na última semana, o Burger King viu sua campanha mais recente levantar um extenso debate sobre a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD): a marca estava fazendo transferências via PIX de R$ 0,01 para consumidores seletos da sua plataforma “Clube BK”.

Apesar da premissa interessante — convenhamos, quem não gosta de “ganhar” um PIX? — a ideia do Burger King trouxe questionamentos relacionados à transparência, com algumas pessoas indicando falta de ética e o perigo de se aplicar dados pessoais a interações de experiência de marca.

Imagem mostra o logotipo do Burger King em frente a uma de suas principais lojas
Imagem: Burger King/Divulgação

De acordo com o advogado especializado em direito digital, Alexander Coelho, a rede Burger King se arriscou ao usar o PIX como ferramenta de marketing. Para ele, isso pode esbarrar em três principais pontos da LGPD: finalidade, consentimento explícito e transparência.

“Os consumidores forneceram suas chaves PIX para transações financeiras, não para ações de marketing. Usá-las para outro propósito pode caracterizar desvio de finalidade.”

Alexander Coelho, advogado especializado em direito digital

Ele também mencionou que o legítimo interesse poderia justificar a prática, desde que fundamentado por um relatório de impacto à proteção de dados (DPIA). No entanto, a ausência de consentimento explícito dos clientes levanta preocupações.

Ainda que seja criativa, essa ação do Burger King está em uma zona cinzenta da LGPD. Empresas precisam alinhar inovação e boas práticas de privacidade, evitando desgastes. Afinal, a linha entre o engajamento criativo e o abuso de dados é tênue”, concluiu.

Finalidade do PIX pode gerar dúvidas na ação do Burger King

Um ponto contencioso, levantado pelo advogado, reside no fato de que o PIX, usado como forma de comunicação de marketing pelo Burger King, é única e exclusivamente um meio de pagamento.

Originalmente concebido em 2016, durante o governo do ex-presidente Michel Temer, o PIX veio para substituir ferramentas de transferência bancária — como o DOC e o TED — ao fazer transações do tipo sem atraso, de maneira imediata e com zero tarifas.

Segundo o Banco Central, o método de pagamento foi o mais popular em 2023, sendo usado por aproximadamente 75% da população brasileira. Naturalmente, o alto volume de usuários implica em dados cadastrais abrangentes — o que configura uma mina de ouro para ativos digitais como campanhas publicitárias e comunicação pela internet…e uma dor de cabeça para a manutenção e fiscalização da LGPD.

Coelho, no entanto, alerta para o fato de que essa aplicação do PIX, pelo Burger King, pode levar à confusão dos consumidores, que podem se sentir lesados devido à falta de clareza e transparência com as quais algumas marcas podem tratar suas informações pessoais.

O advogado afirma que, casos onde consumidores desejarem mais esclarecimentos, a primeira coisa a ser feita é verificar as condições dos termos de adesão do programa Clube BK, a fim de entender os usos permitidos de seus dados, e exigir esclarecimentos junto à empresa por meio de reclamações na Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).

Imagem mostra símbolo do PIX, em compras online
Imagem: Freepik/Reprodução

Burger King se defende: ação com PIX está em conformidade com a LGPD

Do outro lado da discussão, o Burger King enviou posicionamento ao Promoview, por meio de sua assessoria de imprensa. De acordo com a empresa, a ação com PIX é justificada dentro dos termos da LGPD. Especificamente, ela está protegida pelos termos de uso do Clube BK, que são aceitos pelos usuários quando estes ingressam à plataforma.

Mais ainda, a empresa afirmou que dedica recursos extensos à segurança digital, dizendo que o Clube BK assegura a privacidade e proteção das informações dos seus usuários. Veja a seguir o comentário na íntegra:

“A ideia nasce de uma ação de CRM, desenhada para o meio da competitividade de mídia na Black Friday para apresentar nossa campanha de forma inesperada. Trabalhamos exclusivamente com os dados cadastrados pelos próprios clientes, utilizados com consentimento expresso por meio dos termos e condições aceitos no Clube BK e em total conformidade com a LGPD, assegurando a privacidade e a segurança das informações. Em uma data como a Black Friday, onde há uma avalanche de mensagens disputando atenção, o ineditismo desta ação trouxe um ‘push’ realmente diferente. O retorno foi amplamente positivo, especialmente porque foi direcionado aos clientes mais assíduos e engajados.”

Giulia Queiroz, diretora de marketing do Burger King

Mais ainda, a campanha envolvendo o PIX tem tanta confiança, que o Burger King já a expandiu: desde o dia 25 de novembro, a empresa vai abriu a ideia para todos os consumidores.

Basta escanear o QR code em pontos de venda e locais de campanha de marketing da empresa, ou então chamá-la via WhatsApp para participar.

Imagem mostra logomarca do Burger King, que fez campanha promocional com PIX
Imagem: Burger King/Divulgação

Como proteger o seu PIX? Dicas simples para ampliar sua segurança digital

Como forma de pagamento, o PIX exige o credenciamento de “chaves” que funcionam como identificadores para quem vai receber aquele valor. O problema é que mesmo essas chaves podem abrir espaço para a ocorrência de golpes e ações que invalidam seus propósitos de segurança.

Oficialmente, o PIX suporta quatro tipos de chaves: CPF ou CNPJ, número de celular, e-mail e, finalmente, a chave aleatória. Especialistas em segurança digital, no entanto, advogam em favor da última em relação a todas as outras.

Um meme recorrente na internet é: “peguei o WhatsApp de uma pessoa, joguei no PIX, descobri seu nome” e, a partir daí, levantar um histórico de vida breve daquele indivíduo. O meme, no entanto, tem fundamento na realidade, já que se você cadastrar seu CPF ou celular como chave do PIX, esse dado pode acabar se tornando público.

Por isso, a melhor ideia é, sempre que possível, usar uma chave aleatória — que é o próprio sistema bancário quem a gera — ou atrelar à sua conta um QR code para ser escaneado.

Não é que as outras opções “não devem” ser usadas, mas sim que elas podem deixar você mais vulnerável a, por exemplo, golpes online.

Outras dicas incluem:

  • estabelecer um limite (e constantemente revisá-lo) para transferências via PIX: evita que criminosos que roubem o seu celular façam transferências de alto valor
  • nunca usar a senha do banco em outras aplicações: senhas de banco devem sempre ser únicas, e usá-las em outros apps arrisca a sua integridade
  • tenha mais de um método de confirmação: alguns bancos oferecem biometria e senha (não um “ou” outro, mas ambos) para confirmar transações, o que é a melhor forma de assegurar sua saúde financeira
  • nunca clique em links suspeitos nem atenda a orientações de números e ligações desconhecidas