Daniel Dias.
Hoje eu quero dizer a ele: Obrigado por nos fazer felizes.
Acompanho a história deste, que é um dos grandes atletas que o Brasil tem.
Mas Daniel acaba de se despedir dos Jogos Paralímpicos, em Tóquio.
O Brasil perde o seu maior atleta da natação.
Mas ganha, certamente, um líder que fará diferença no esporte, algo que para nós brasileiros, será muito importante.
Na realidade, já faz.
Desde 2014, foi fundado o Instituto Daniel Dias, em Bragança Paulista, que tem em seu propósito, se tornar referência na formação de atletas da natação paralímpica.
Daniel, é daquelas pessoas adoráveis.
Fala mansa, sempre bem-humorado. De bem com a vida.
A conexão é simples, desde o primeiro momento.
Quando o encontrei, ele já tinha feito história, com as medalhas que já havia conquistado.
Me lembro, como se fosse hoje. Marcamos um almoço em Campinas, no Royal Palm Plazza; eu estava lá, em minha atividade de eventos, e fui conversar com ele a respeito de uma palestra sua, para uma das equipes da organização em que eu trabalhava.
Relacionar-se com atletas paralímpicos é um desafio sensacional. Tudo que acontece ou vai acontecer, para você, é algo fantástico; para eles é a coisa mais natural da face da terra.
Um parêntese.
Certa vez, fui apresentar um projeto, para a realização do Prêmio Paralímpico.
Era uma concorrência, e tínhamos que mostrar presencialmente o que havíamos planejado. Entramos na sala, preparamos tudo, checamos tudo. Tudo perfeito.
Aí entrou a comissão do Comitê Paralímpico, para avaliar o projeto.
Quando chegaram, nos apresentaram os 5 integrantes, e uma das pessoas que iria avaliar, era cega.
Logo pensei: como eu faço uma apresentação super visual para uma pessoa que não consegue ver?
Para ele estava tudo certo.
Para mim, bem isso é outra história.
Encontramos com o Daniel e seu pai no lobby do hotel; desafio 1: como cumprimentar um cara, que não tem as mãos?
Para ele, zero problema.
Para mim, outro desafio, do tipo, é pensar rápido.
Chegamos à nossa mesa e nos sentamos.
Começamos a almoçar, tranquilamente.
Lá pelas tantas, me dei conta que ele não tinha mãos.
Novamente as mãos.
Como ele se vira, para comer?
Em sua casa deve haver um aparelho que facilite a operação comer, pensei eu.
Levantei os olhos.
Ele comia e bebia sem qualquer problema. Com a maior destreza. Parecia tudo muito simples.
No dia marcado, entramos na plenária do evento, onde ele, Daniel, iria se apresentar.
Logo que começou a falar, ele encantou com sua história.
Impressionante o bullying na escola, passando por seu casamento, e pelo nascimento de seus filhos.
Ao final arrancou soluços e aplausos de toda a plateia.
O Diretor da área, que liderava o evento, não conseguiu dizer uma palavra no encerramento, tamanha a emoção que o dominou.
Só agradeceu muito pelo exemplo de vida.
Ganhamos a tal concorrência e estávamos acertando os últimos pontos da premiação. Com tantos anos de experiência, não imaginávamos a quantidade de diferenças que existiam, em relação aos eventos que fazemos. Começamos a entender realmente o que é inclusão social, sustentabilidade, o que é um ambiente preparado para o deficiente de qualquer natureza.
São detalhes, que para quem nunca se preocupou em resolver, nos ensinaram algumas lições interessantes.
1. Onde se tiram cadeiras para reservar espaço para os cadeirantes?
2. Não podemos ter degraus em lugar nenhum; só rampa, inclusive no trajeto entre a calçada da rua e lugar da celebração.
3. Sim; precisa da rampa? Qual a inclinação que ela deve ter, para que um cadeirante possa ter acesso, sem ajuda, por exemplo?
4. E como os cegos fazem, considerando que, certamente, não existe o piso tátil?
5. Como faz para um atleta, sem braço, receber seu troféu?
6. Como cumprimentar um cego, com um simples aperto de mão?
7. Como fazer para que os cegos possam acompanhar (ver) o evento?
Existe um cem número de detalhes, que precisam ser cobertos, para que não aconteçam problemas.
Ah, sim; antes que venham criticar, escrevi cegos e não, deficientes visuais. Sim, eles se tratam assim. Fazem piadas. E se alguém vem com esta história, rapidamente reagem dizendo para parar com essa bobagem. Um deles me disse, que o cara que inventou a expressão “melhor idade”, deve ter morrido cedo. E era primo do sujeito que veio, com essa transa de necessidades especiais.
A história do Daniel é gloriosa.
A, do esporte paralímpico brasileiro, também.
Mas, a Paralimpíada acabou, e tudo voltará ao normal. Notícias destes heróis, só quando ganharem outra medalha em Paris, ou quando morrerem, com uma linha de reconhecimento e homenagem.
Isto também não é diferente para os esportes olímpicos.
A moda, sai de moda, rapidamente.
Não somos capazes de dar as grandes notícias positivas. Só, as negativas. Criticamos, mais do que elogiamos. Isto é parte do DNA do complexo de vira-lata, tão bem cunhado, pelo grande Nelson Rodrigues.
Acompanhem este outro fato.
Parapan de Toronto 2015.
Voo que trouxe, parte da delegação, brasileira.
Pela primeira vez, entrei num avião, onde a fila de passageiros sem necessidades de locomoção, era muito menor do que a outra. O embarque levou mais de hora. Problemas? Nenhum; só muita brincadeira e zoação.
No desembarque, pensei: vai ser um perereco.
Temos 46 medalhistas a bordo deste voo.
Haverá muita gente para recebê-los.
Surpresa! Ninguém. Nenhum fotógrafo, cinegrafista e repórter.
Os atletas, já acostumados, passaram direto, e pareciam nem ligar para a total ignorância dos veículos de comunicação.
46 medalhas. Mais do que o Brasil ganhou em 3 olimpíadas.
Por isso, Daniel Dias, você, como um ícone de sua área, acabou de tomar para si uma prova de longa distância, cheia de obstáculos.
Trabalhar para trazer os nadadores paralímpicos, aos pódios das grandes competições, exigirá de você um esforço muito grande.
Eu tenho certeza de que você fará a sua parte, como já está fazendo, muito bem. Espero que aqueles todos, que te deram um tapinha nas costas e saíram em inúmeras fotos contigo, lembrem-se e cumpram seus papéis, nesta nova prova de natação, em que você agora está.
Minha admiração por este cara incrível, Daniel Dias.
Você me tornou mais feliz.
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