Nova Zelândia. Estádio Eden Park. Na cerimônia de abertura da maior Copa do Mundo de futebol feminino já realizada não poderia faltar o haka. Haka é o nome genérico de como é conhecida a dança da etnia maori. Os All Blacks (e muitas outras equipes neozelandesas de rúgbi) a utilizam nas partidas para exibir sua força e unidade ao adversário. Essa superseleção usa um haka para simbolizar e mostrar ao mundo a integração racial e cultural, o que contribui para a unidade do país, de diferentes origens e etnias.
Pois bem, acho que este é o ponto: intimidatório. A maioria da imprensa que cobre futebol é composta por jornalistas, narradores, comentaristas do gênero masculino. Ainda bem que alguns veículos de comunicação já têm comentaristas de outro gênero. Entretanto, NO ÚLTIMO DIA 23/7, li uma matéria afirmando que esta Copa do Mundo é a maior Copa LGBTQIA+.
Com base em quê essa afirmação foi feita?
Alguém pesquisou na última Copa masculina, em 2022, quantos atletas não se declararam sendo do gênero masculino?
Impossível dizer.
A Copa aconteceu no Catar, país com uma visão completamente diferente da Austrália e da Nova Zelândia. Além disso, quantos se atreveriam a assumir esta condição? Principalmente num esporte que se confunde muitas vezes com o exercício e a demonstração da masculinidade, não é mesmo?
Meus amigos, para mim tanto faz o gênero dos atletas.
Mas para que possamos oferecer uma análise com pesos e medidas iguais, deveríamos ter cuidado redobrado ao fazer afirmações da natureza, que está retratada naquela matéria. Afinal, isso não interessa, principalmente na perspectiva do esporte, não é verdade? Será?
O que acontecerá se aparecer um jogador, craque de bola, titular em qualquer seleção de qualquer país, que nasceu mulher e se transformou em homem?
Como deveremos tratar o caso?
No voleibol isso já acontece.
No futebol, não é difícil inferir o que vai rolar em termos de comportamento, definições etc. Será mais fácil um homem que se transformou em mulher jogar numa competição feminina que o contrário.
Acredito, então, que essa matéria, além de não fazer nenhum sentido, nem deveria ter sido escrita e muito menos publicada.
O ponto é simples: temos duas Copas de futebol, uma feminina e outra masculina. Ponto.
Por que então afirmar que esta Copa é a que temos o maior contingente de pessoas que se declaram LGBTQIA+? Será que essa preocupação não aponta para um preconceito, antigo aqui no Brasil, de que mulher não joga futebol? Será que este não é um dos fatores importantes que mais impediu o desenvolvimento deste esporte, em sua versão feminina?
Lembrando, que a modalidade esteve proibida para as meninas durante décadas. Em 1965 existia o Conselho Nacional de Desportos, que controlava o desenvolvimento dos esportes no Brasil, reiterava que o futebol feminino era proibido por ser um esporte inadequado para o sexo feminino.
Ainda bem que superamos e que aqui, no país do futebol, já temos campeonatos estaduais, regionais, brasileiro e continental sendo disputados normalmente. Mais um passo importante no desenvolvimento desse esporte tão familiar a nós todos.
Me traz muita felicidade ver nas quadras, nos campos, meninas jogando futebol normalmente. Principalmente pelo fato de gostarem de praticar o esporte. Também gosto de assistir jogos narrados e comentados por mulheres. Para mim, pouca diferença existe.
Mulher.
Mãe.
Esposa.
Avó.
Profissional.
Artilheira.
Goleira.
Zagueira.
Espero, sinceramente, que possamos encarar essa nova realidade de maneira sensata, e que patrocinadores possam se beneficiar dessa modalidade. E, mais importante que tudo isso: o simples fato de estarmos diante da TV, torcendo pela seleção brasileira de futebol feminino, pode certamente contribuir para que nos tornemos pessoas melhores, menos preconceituosas, podendo olhar e dar o valor que merecem as mulheres em nossa sociedade.
Penso que esta é uma boa oportunidade para tal demonstração. Entretanto, esta Copa do Mundo precisa ser intimidatória mesmo. Principalmente no sentido de se ter respeito pelo público, pela adversária, pelo esporte.
E na estreia do Brasil contra o Panamá, já pudemos ver um futebol bem mais bem jogado do que o do time masculino. E ninguém reclamando que a técnica é americana.
Esperamos, também que não tenhamos cenas de mau gosto ou vexatórias, como aquela em que o melhor goleiro da Copa de 2022, eleito pela FIFA, ao receber o troféu o transforma em falo, colocando-o à frente de sua genitália.
Aliás, se tivéssemos mulheres nos postos de maior destaque na FIFA, duvido que aquela cena tivesse passado em branco.
E fica uma pergunta, quando teremos então uma presidente dirigindo o futebol mundial?
Meninas, mulheres de todo o mundo que estão construindo esse evento mundial, atentem para esta responsabilidade.
A Copa, como evento esportivo de alto nível, precisa ser um HAKA. Intimidatório, sim.
O futebol feminino pedindo passagem.
No sentido de mostrar a sua beleza, a magia de se ver uma equipe praticando o que de melhor existe no mundo da bola.
Intimidatório sim, na garra de se mostrar que é maravilhoso e encantador, assistir a uma disputa no futebol, onde se mostram novos caminhos para a bola percorrer.
Não é só futebol, mas também uma página importante na narrativa da participação feminina na história.
Foto: Chris Hyde – FIFA/FIFA via Getty Images