A crise climática em nosso planeta é real e já está acontecendo. Por consequência, cada vez mais, os festivais de música e eventos ao ar livre estão sendo cancelados, adiados ou de alguma forma afetados por eventos climáticos extremos, incluindo fortes chuvas e inundações, tempestades e ventos fortes, entre outras condições desfavoráveis.
Mas esta já era uma tragédia anunciada? Podemos dizer que sim. Nas últimas décadas, cientistas vêm alertando, por meio de relatórios como os realizados pelo IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) sobre os efeitos do aquecimento global em médio e longo prazo.
O último Relatório de Avaliação (AR6) do IPCC foi lançado no dia 20 de março deste ano. Segundo o estudo, o planeta já está com 1,1°C de aumento na temperatura terrestre.
Ao longo de quase oito mil páginas, o AR6 detalha as consequências devastadoras do aumento das emissões de gases do efeito estufa (GEE) em todo o mundo. E este é só o começo!
O setor de eventos é, infelizmente, um dos primeiros afetados pela crise climática global
Prova disso são os acontecimentos que acompanhamos nas últimas semanas e meses.
O mais recente foi do festival de música eletrônica Tomorrowland, que teve seu primeiro dia adiado, pois as áreas internas, estacionamentos e vias de acesso foram atingidas por fortes temporais, chuvas e alagamentos, provocando danos significativos ao evento.
Nossa equipe esteve por lá e te conta, com detalhes, todos os perrengues que aconteceram nessa “não estreia”. Clique no vlog abaixo e confira!
Outro evento que precisou remanejar duas vezes sua data de estreia foi a Oktoberfest Blumenau (SC).
A maior festa germânica da América Latina ficou à mercê do clima instável e fortes chuvas que acabaram transbordando o Rio Itajaí-Açu – o principal da cidade – que fica próximo ao local que aconteceria o evento.
As previsões da Defesa Civil de Santa Catarina afirmaram que o rio poderia chegar aos 12 metros de altura. O que colocaria em risco máximo os participantes do festival.
Outros dois festivais brasileiros foram afetados pelo aquecimento global, o Festival Doce Maravilha e o The Town.
No primeiro, o cantor Caetano Veloso, um dos headliners do evento, precisou começar seu show com horas de atraso devido às fortes chuvas.
Já no The Town também teve seu primeiro dia afetado pelas tempestades. Os fãs enfrentaram uma chuva torrencial, entre momentos de garoa, com direito a raios e trovões na Cidade da Música, montada no Autódromo de Interlagos, em São Paulo.
Fora do Brasil, um outro exemplo de evento impactado pelas mudanças climáticas foi o Burning Man, porém de uma forma ainda mais grave.
O festival que deixou 70 mil ilhados e um morto nos EUA, aconteceu no deserto de Black Rock, no estado de Nevada.
Mas afinal, o setor de eventos está à deriva? Quem está olhando para toda essa situação?
“É triste pensar que a natureza fala e que o gênero humano não a ouve.” (Victor Hugo)
Os impactos e as previsões das alterações climáticas pioraram. No entanto, continua existindo uma lacuna na avaliação das medidas de adaptação no contexto dos últimos acontecimentos e, o que é mais preocupante, a falta de qualquer evidência de esforços estratégicos para a adaptação aos riscos relacionados com o clima.
Entre as muitas consequências desta lacuna está a necessidade de considerar a ameaça que as condições meteorológicas extremas representam para o setor de eventos, e as suas implicações para a ação da indústria e de políticas governamentais.
Um alerta durante a criação desta matéria foi que não há nenhum tipo de estudo ou pesquisa realizada no Brasil sobre o tema.
Entendemos que em muitos estados não há ao menos um plano de enfrentamento às mudanças climáticas nem em outros setores como o de saneamento básico, por exemplo.
Ou seja, a caminhada será longa!
Os planos de gestão de segurança de eventos que já são exigidos aos festivais de música terão de ter em conta uma maior frequência e gravidade de eventos climáticos extremos, para refletir as previsões atuais fornecidas por organismos nacionais e internacionais.
A realização de festivais neste contexto envolve responsabilidades e custos crescentes, que infelizmente precisam ser cada vez mais previstos e considerados nos orçamentos das equipes de produção.
Isto agrava a questão da sustentabilidade financeira. O aumento dos custos e dos riscos de realização de um festival de música terá um impacto ainda maior em eventos mais novos e menores, retardando assim a inovação e a diversidade.
Previsões de medidas e consequências da crise climática nos festivais
A realidade é que as mudanças climáticas podem exigir mudanças culturais.
Os festivais de verão ou determinados meses do ano, por exemplo, podem chegar a ser revistos e remanejados. Mas o quanto isso irá afetar o calendário cultural de uma região ou do país como um todo?
Já imaginou termos que começar a comemorar o carnaval em julho? Ou se a própria Oktoberfest tivesse que ser realizada em outro mês? Mudaria-se o nome do evento, que é o que representa o próprio festival?! São tantas camadas…
Outro ponto de alerta é de que, apesar dos esforços de muitos festivais para encontrar formas de melhorar as suas pegadas de carbono, o impacto das viagens em festivais continua difícil de compensar.
É claro que não há um culpado. A crise climática é uma consequência de um modo de vida geral, das grandes indústrias e de como os meios de consumo são produzidos ao longo de milhares de décadas.
A questão aqui é justamente criar uma red flag que possa trazer a discussão para o centro e, quem sabe, chegar nas instituições certas.