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The Town repudia matéria do Intercept Brasil sobre trabalho degradante na última edição

Reportagem do The Intercept Brasil coletou depoimentos de vendedores que afirmam terem passado por várias situações como falta de pagamento, acesso restrito à água e alimentação, situações de assédio, entre outras.


Atualizado em 04/12/2023 às 23:29

O The Town 2023, que aconteceu em setembro no Autódromo de Interlagos, em São Paulo, foi um enorme sucesso com apresentações de Bruno Mars, Ludmila e Maroon 5, recebendo um público que comprou aproximadamente 500 mil ingressos para os cinco dias do evento.

Porém, segundo matéria do Intercept Brasil, a repercussão do festival não foi positiva para muitos trabalhadores ambulantes, que alegaram terem sido submetidos a condições de trabalho degradantes, além de, em alguns casos, não terem recebido o pagamento correto.

Confira o que alega a reportagem e os detalhes de contratação compartilhados pela própria organização do festival, ao Promoview.

O-festival recebeu cerca de 500 mil pessoas em 5 dias. Foto: Divulgação

O que diz a reportagem

De acordo com a agência de notícias, que conduziu uma investigação com duração de um mês, alguns dos vendedores que trabalharam durante o festival afirmam terem passado por situações ilegais, além de problemas como falta de pagamento. 

As atividades exercidas por estes trabalhadores incluíam a venda de bebidas, para as quais eram necessário percorrer longas distâncias sob o sol para reabastecer o estoque. Segundo os relatos, uma empresa proibiu os trabalhadores de apoiarem suas mochilas no chão, com o intuito de impedir momentos de descanso.

Contratos de sete funcionários revelaram que a remuneração tinha como base apenas comissões, sem garantia de um valor mínimo, o que é considerado ilegal de acordo com advogadas especializadas que estão acompanhando o caso. A legislação exige que, em contratos de comissão, haja a garantia de pelo menos o salário mínimo, já que essa forma de contratação transfere o risco do negócio para o trabalhador.

Além disso, muitos trabalhadores dizem terem enfrentado dificuldades na entrada do evento, com credenciamento negado mesmo após emissão de documentação necessária, o que resultou em longas esperas e condições desfavoráveis. Os contratos mostram remuneração baixa para os ambulantes, com a necessidade de vender uma grande quantidade de produtos para atingir valores significativos.

Segundo a reportagem do Intercept, além das condições de trabalho degradantes, os ambulantes alegam não terem recebido o valor integral pelo trabalho no The Town. Há denúncias de erros nos cálculos de pagamento, com valores a mais repassados a alguns trabalhadores e a menos para outros. 

Acordo verbal para pagamento de comissões

Um fato levantado na matéria original, foi referente à discrepância nos pagamentos entre os trabalhadores no The Town 2023 chamou a atenção de dezenas de profissionais desde o primeiro dia. De acordo com os relatos, enquanto alguns ganhavam R$ 1 por chopp, outros, em sua maioria do Rio de Janeiro, estavam em um esquema mais lucrativo. 

Valor pago aos ambulantes, segundo trecho do contrato. Foto: Reprodução/Intercept Brasil

Diante dessa disparidade, muitos dos trabalhadores ambulantes decidiram se mobilizar no segundo dia, interrompendo o serviço até que as condições de pagamento e trabalho fossem revistas. 

Uma mediação com auditores fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego resultou em um acordo verbal para melhorar as comissões. No entanto, os trabalhadores afirmam que as promessas não foram cumpridas, e que muitos não receberam o valor integral. Além disso, relatam humilhações durante o trabalho, como a falta de acesso fácil à alimentação e transporte.

As advogadas Maira Pinheiro e Tainã Góis organizaram uma ação coletiva contra as empresas na justiça, além de petições junto ao Ministério Público do Trabalho e ao Ministério do Trabalho e Emprego. Elas argumentam que o contrato é ilegal por várias razões, incluindo a remuneração baseada apenas em comissão, o que é proibido pela CLT.

O que diz a organização do festival

Em Nota de Repúdio, a Rock World negou veementemente as acusações declarando que “não há qualquer acusação formal contra a empresa” e que o Intercept Brasil “utilizou o nome dos seus organizadores e da Rock World para ganhar notoriedade e visibilidade na web”.

Segundo a nota, “são mais de 20 mil pessoas trabalhando no evento, sendo cerca de 850 ambulantes contratados através de três empresas terceirizadas. Para receber as credenciais, os trabalhadores precisavam estar com as suas documentações válidas, que foram apresentadas na sala de triagem, situada no exterior do evento. Devido às normas e exigências da organização do festival, tais empresas terceirizadas credenciaram apenas pessoas com documentação regularizada para o evento, bem como a realizaram os devidos pagamentos legais incluindo tributos.

Importante dizer que o The Town repudia qualquer forma de trabalho que não siga as regras de respeito ao trabalhador seja em relação ao modelo de contração, segurança, valores e alimentação oferecidas.” diz em nota.

Já a 2East afirmou para a reportagem que todos os trabalhadores foram devidamente registrados sob regime CLT, com carteira de trabalho anotada, e tiveram suas remunerações, benefícios e encargos quitados de acordo com a legislação – segundo a reportagem. A empresa também afirma ter distribuído bebedouros e vouchers de alimentação, além de EPIs, e diz ter sido “devidamente fiscalizada”, sem que nenhuma irregularidade tivesse sido encontrada. Leia aqui a resposta completa da empresa.

O Ministério Público do Trabalho e o Ministério do Trabalho e Emprego ainda não se manifestaram sobre o caso.

Como o The Town contrata para o evento

Em nota original enviada ao Intercept Brasil, a organização esclarece como realiza a contratação e fiscalização em seus eventos:

“A organização informa que todos os parceiros são instruídos a realizarem os processos de contratação dentro da legislação brasileira e não admite qualquer ação que viole os direitos humanos. Integrantes do Ministério Público estiveram presentes acompanhando todo o trabalho executado. Importante dizer que o The Town repudia qualquer forma de trabalho que não siga as regras de respeito ao trabalhador seja em relação ao modelo de contração, segurança, valores e alimentação oferecida. 

Imprimimos no The Town, desde o primeiro momento, um padrão de trabalho e profissionalismo que marca a trajetória de mais de 30 anos da Rock World nesse segmento com a produção do Rock in Rio – no Rio, em Lisboa, em Madri e em Las Vegas. Todos os trabalhadores nos eventos produzidos pela Rock World, empresa detentora do The Town, seguem padrões rigorosos de contratação. 

São eles: 

  • Profissionais próprios: 
  • Registro CLT 
  • Fazendo parte dos Programas de Saúde e Segurança do Trabalho da RW (PGR e PCMSO) 
  • Uso de Equipamento de Proteção em toda área do evento durante a montagem e desmontagem 
  • Vale alimentação e transporte 
  • Comprovação do vínculo jurídico civil ou societário quando aplicável 
  • Empresas terceirizadas são obrigadas (assim como subcontratados por eles): Registro CLT de toda equipe 
  • PGR – Programa de Gerenciamento se Riscos e Inventário de Riscos PCMSO – Programa de controle médico e saúde ocupacional 
  • ASO – exame admissional ou periódico 

A empresa passa por uma checagem prévia dos programas supracitados para poder seguir para fase de credenciamento quando exigida comprovação de vínculo 

Cada empresa oferece os benefícios cabíveis para sua equipe como transporte e alimentação. 

As empresas 2East e StafOne foram contratadas e seguiram as regras estabelecidas pelo evento ao executarem o trabalho.”.

 

Foto de capa: Gazeta do Povo