O IAA é o Salão do Automóvel da Alemanha. International Automobil Ausstellung é o significado da marca em alemão.
É o mais tradicional evento sobre automóveis no país que é muito conhecido pelos seus automóveis. Em especial os do segmento luxo. Tudo ia bem até 2019 (pré-covid).
O evento acontecia há mais de 100 anos e já teve edição que atraiu mais de 1 milhão de pessoas. Mas a eletrificação e a mobilidade urbana passaram como um furacão em Frankfurt onde ocorria desde 1951, e os organizadores cancelaram o evento.
Decisões-de participação são tomadas bem antes do evento, então, não foram influenciadas pela pandemia. A indústria automobilística sabia que precisava evoluir, não só formato mas, principalmente, no posicionamento.
O Salão do Automóvel mais tradicional do mundo virou um salão da mobilidade e seus desafios. Mudou de cidade. Foi para Munich. Saiu do pavilhão tradicional e passou a ocupar também outros espaços na cidade.
Cidade governada por uma coalizão de partidos verdes, ou seja, decidiram enfrentar o touro pelos chifres. Algumas análises em um evento referência como esse são válidas. O IAA terminou dia 12 de setembro:
1) Evento foi híbrido – Além da participação presencial, você poderia ter comprado um ingresso que daria acesso a todos as live streamings de conteúdo. Bom, isso eu acho que é quase óbvio, pois qualquer evento meramente relevante vai ter que fazer isso a partir de agora. No big deal.
2) Evento foi menor – A opulência da indústria estava presente, mas em outra escala, e os discursos dos CEOs presentes focavam basicamente na visão de futuro da indústria. O evento que antes durava 10 dias foi reduzido a 6. CFOs estão de olho em tudo. O público caiu quase pela metade em relação à última edição em Frankfurt. Mesmo assim, ficou entre os maiores eventos realizados em todo o mundo neste momento de quase pós-pandemia.
3) Evento ampliou seu posicionamento – Antes um “clube das montadoras”, o evento teve que aceitar os sinais dos tempos e se voltar ao amplo conceito de mobilidade. Tinha desde bicicletas Treck como também Dolby como expositores. A busca por relevância é uma missão de todos os eventos hoje em dia. Quem não for relevante vai morrer. Lei da selva pós-Covid. No caso do automóvel, a pompa e circunstância do setor abriu as portas para capacetes, táxis aéreos, marcas de tunning e várias outras empresas que antes não eram bem-vindas no clube!
4) Teve muito conteúdo on site e virtual – A busca por relevância passa por falar os assuntos do setor como um todo e não somente os assuntos que interessam ao setor. Mohamed Yunnus (vencedor do prêmio Nobel) falar virtualmente que a “Indústria automotiva fez escolhas erradas no passado e hoje vive na correção deste legado.” É quase que uma fogueira acessa no coração da indústria. Tem que ter coragem para convidar os seus críticos a falarem no seu evento, mas esta atitude corajosa remete ao ponto que os desafios são enormes
5) Envolveu muitos stakeholders – Eventos setoriais são excelentes plataformas paras as empresas do setor se relacionarem com stakeholders externos. Angela Merkel participou da abertura em um dos seus últimos eventos como chanceler da Alemanha. Mas não foram só flores. Munique é uma cidade engajada na questão da melhoria da mobilidade urbana, mirando em Copenhagen e Amsterdam como seus benchmarkings. Protestos contrários ao evento aconteceram. Polícia de choque inclusive teve que agir. Mas este é o mundo que vivemos hoje. Existem opiniões contrárias a praticamente tudo que as sociedades e as marcas falam/fazem.
6) Evento se relacionou com a cidade – Algo um pouco distante da nossa realidade aqui no Brasil, mas as pessoas que compravam o ingresso para visitar o evento tinham acesso gratuito ao sistema de transporte público da cidade. Ou seja, priorizaram outros modais que não os automóveis para acessar o evento. Ocuparam a principal praça da cidade (Marienplatz) com um espaço dedicado a dialogar com os cidadãos da cidade. Sensacional. Mas essa é uma característica positiva do governo alemão que claramente tem políticas de estado para utilizar eventos como alavancadores das economias locais. Que inveja eu tenho da Alemanha neste quesito. É de tirar o chapéu. Nota 10 para o planejamento e execução do quesito mobilidade do evento sobre mobilidade urbana em uma cidade governada pelos críticos da indústria!
7) Evento focou em experiências – Novamente aqui é falar o óbvio. Os eventos presenciais se diferem dos eventos virtuais exatamente no quesito de utilização dos cinco sentidos humanos. Ter uma via da cidade reservada parcialmente para as pessoas fazerem o test-drive de veículos elétricos faz parte deste conceito e diálogo do evento com o espaço público. A mobilidade não pode e não deve ser vista como um artigo de luxo e caro. Tem que ser acessível a todos os cidadãos das cidades. Este talvez seja o maior desafio da indústria.
Todos estes pontos mostram claramente que a indústria de eventos presenciais “não morreu” como muitos previam. Mas a pandemia atingiu esta indústria de forma muito contundente e os players do setor estão tendo que rever todos os seus paradigmas.
Achar que vai organizar o evento (qualquer um) exatamente como se organizava antes da pandemia é um erro enorme. A tecnologia é parceira, não inimiga.
Os stakeholders estão aí para serem envolvidos, não só convidados. Os custos precisam ser reduzidos, as exigências dos CFOs estão gigantes.
A relevância esta aí para ser buscada e amplificada. Não ache que as pessoas não vão te criticar por algo que você ou seu setor estão fazendo. Dialogue, não evite.
O mundo como um todo mudou e os ex organizadores de eventos (agora catalisadores de comunidades) precisam ter esta noção para não perderem as enormes oportunidades que os eventos híbridos com mensagens ESG vão propiciar a todos nós.
Afinal o live marketing não é para os fracos(as).
Foto: Reprodução.