Quando comecei a trabalhar em grandes empresas, passei a conviver com os conceitos, recebidos da alta administração, que deveríamos perseguir durante o ano. Todas as metas, todos os projetos tinham a inspiração daqueles que comandavam a empresa.
O tempo foi passando. Subi na hierarquia, e esses conceitos passaram a ficar mais perto de mim, e eu, a ter a missão de disseminá-los junto aos meus times. Em alguns momentos, achei que não cabiam aqui e ali. Mas a maioria daquelas palavras formava uma maneira de atuar e obter os resultados desejados. Me lembro muito bem de uma expressão, pois, apesar de extremamente simples, era a que mais fazia sentido em meu pensamento naquele ano, uma forma de transformar conceito em atitude: SENSO DE URGÊNCIA.
No-esporte mundial, especialmente no futebol, esse conceito deveria ser aplicado com toda a urgência que o senso permitisse. No entanto, ao contrário do que se imagina, estamos naquele caminho de fazer apurações, indagações e uma série de subterfúgios que não levam a lugar nenhum, apenas procrastinam uma decisão do que já é um fato.
Estou falando do beijo do presidente da Real Federação Espanhola de Futebol, Luis Rubiales, na jogadora Jenni Hermoso. Seu ato serviu para que a mídia, em vez de abordar o grande feito da seleção feminina de futebol da Espanha, campeã pela primeira vez, abordasse com mais ênfase do beijo roubado, ou do “selinho”, como disseram alguns, tentando minimizar o ato do senhor presidente.
Meus caros amigos, uma pessoa pública, exercendo um cargo de representação internacional, resolve fazer o que fez. E, se prestarmos atenção na cena, ainda veremos um tapinha nas costas, um sorriso juvenil de satisfação e uns passinhos comemorando o feito. Com todos esses elementos, o mundo esportivo, passado todo o tempo que passou, ainda está discutindo o que fazer.
Senhores, SENSO DE URGÊNCIA. Afinal, o que será apurado? A ação de assédio aconteceu diante de milhões de pessoas. O que mais precisa ser dito dessa situação?
O poder público já se manifestou em todas as esferas. A FIFA, bem a FIFA quer fazer um processo para ver no que dá. O técnico da seleção e as jogadoras também tomaram uma posição dura em relação a Don Rubiales. Mas e os patrocinadores? Foram ágeis o suficiente e se posicionaram quanto ao fato? Nada. Não sou adivinho, mas em algum momento esta conta vai chegar. Porque não tomar uma atitude em defesa daquelas que tão bem representaram suas marcas. Pergunto, o que estão esperando? E ainda vou mais a fundo: aqueles que colocam seus investimentos em marketing do esporte, em torneios e campeonatos promovidos pela federação que esse senhor ainda, de certa forma, representa precisam se posicionar? Garanto que se formos pesquisar, estas empresas assinaram tratados e cartas de direitos humanos, e hoje desenvolvem programas voltados conceitos que compõem a ESG.
Temos diversos casos, e certamente ainda virão outros, em que determinadas atitudes ou fatos, quando ocorrem, não vão trazer aos que patrocinam o esporte o resultado planejado. Até quando esses patrocinadores ficarão submissos ou reféns de tomar uma atitude, com receio da reação dos seus consumidores? A estes aviso que cada vez mais a sociedade se mobiliza em relação a tais fatos. Não me surpreenderei se, num espaço curto de tempo, houver algum movimento nesse sentido.
Eu não gostaria de fazer comparações, mas não tem jeito. Aqui, em nossa terra, descobriu-se um terrível esquema de manipulação de resultados esportivos. Rapidamente apareceram alguns dos envolvidos, mas é óbvio que existem outros, e providências foram e estão sendo tomadas com celeridade, afinal não há muito que contestar. Jogadores suspensos, penas sendo internacionalizadas, e vida que segue. Sei que pode parecer esquisito, mas em minha opinião é mais do que esquisito.
Voltemos ao caso do beijo roubado; devemos considerar sim que são dois países diferentes, em situações diversas. Até posso concordar, mas será que o fato de termos homens julgando homens para salvaguardar os direitos e a lisura de uma das indústrias mais importantes da atualidade, na maior parte liderada também por homens, e do outro lado homens julgando uma atleta mulher, uma equipe feminina, em uma copa a que os senhores dirigentes não deram a importância que dão quando se trata do futebol masculino?
Para encerrar, não sei quem assessora os dirigentes espanhóis, mas colocar em dúvida razoável o episódio (houve consentimento ou não) é uma linha de comunicação das mais ridículas. Como uma atleta, mulher, poderia dar ou não dar consentimento para um beijo na boca, no momento da celebração de um título esportivo? Me perdoem, mas se eu representasse qualquer marca, por respeito aos meus clientes, romperia o contrato por justa causa. Não me cabe julgar ninguém; agora, construir um castelo de areia em cima de uma situação clara, me parece um erro enorme. E para os patrocinadores, o que acontecerá na hora em que esses dirigentes tiverem outros interesses?
Jenni Hermoso já experimentou o que o SENSO DE URGÊNCIA é capaz de fazer, pois a imprensa do mundo inteiro quis noticiar o fato. Ela será lembrada como a campeã mundial que teve um beijo roubado na cerimônia de premiação da Copa do Mundo. Quanto vale essa alcunha ridícula para uma atleta, independentemente de qualquer coisa?
Para a Real Federação Espanhola e para a FIFA, que se escondem em apurações e reuniões intermináveis e não conclusivas, o tempo vai passar e ninguém vai se lembrar dos envolvidos nesse episódio. Parece até aquela máxima que percorre os corredores das empresas: quer que algo não seja resolvido, crie um grupo de trabalho formal.
Atenção profissionais do marketing do esporte, é preciso estarem atentos, e serem muito rápidos no gerenciamento de crises. Tomem as atitudes para defenderem suas marcas. Certamente outras situações de racismo, machismo, ou qualquer coisa do gênero acontecerão.
Estejam preparados.
*fico ainda mais irritado com o fato de a atitude do goleiro eleito o melhor do mundo e da Copa do Catar, ao fazer do troféu que recebeu, um falo, não ter tido quase nenhuma repercussão, e nesse caso um homem faz uma mulher passar para história como uma vítima de assédio, em uma cerimônia de premiação.
Foto: Reprodução