Estamos vendo uma verdadeira inversão de valores quando falamos em valorização das empresas.
Uma série de novos indicadores de performance vem ganhando relevância para se montar o “valuation” de uma empresa, principalmente nas startups e aquelas que se apoiam na tecnologia para construir o seu modelo de negócio.
Cada vez mais os indicadores se referem a crescimento da base de clientes, crescimento do faturamento, receitas recorrentes, tamanho do mercado, transformação do mercado, criação de novos hábitos de consumo e escalabilidade do negócio.
Indicadores tradicionais como fluxo de caixa, EBITDA e lucro líquido cada vez perdem a sua relevância ao se avaliar um negócio que tem a tecnologia como principal foco do negócio.
Estamos vendo empresas com planos extremamente arrojados, tendo uma avaliação exponencial e se transformando nos famosos unicórnios sem ao menos entregar um resultado mínimo na última linha.
Cada vez vemos mais e mais eventos, grupos de investidores e até grandes empresas montando seus grupos de anjos e venture capital para desenvolver estas iniciativas visando transformar os formatos de consumo e desenvolver novos negócios.
Isto é o resultado de todas as oportunidades que a tecnologia, o compartilhamento e o mobile estão criando na alteração dos formatos de negócio e hábitos de consumo e da abundância de recursos monetários que temos hoje em todo o mundo.
Investidores de todos os portes que antes tinham um porto seguro nos juros dos grandes países estão buscando novas formas de investimentos em função dos juros zeros ou até negativos na maioria dos países desenvolvidos.
Isto também acontece porque esses investidores acreditam que neste formato podem multiplicar seu capital investido em 10, 20, 30 ou milhares de vezes caso consiga vender bem a empresa investida.
Estamos vendo uma grande onda criando empresas que têm como base de capital os aportes de investidores e não o lucro.
Podemos citar algumas grandes empresas e unicórnios que cresceram e tem este modelo como formato de negócio: Uber, Spotify, Ifood, Rappi, Nubank e WeWork.
Porém, para entregarem todos os indicadores de crescimento exigidos e para mudar os hábitos de consumo, as necessidades de uso do capital para fazer promoções, estimular o consumo, dar descontos, construir equipe e desenvolver as tecnologias proprietárias são gigantescas e o consumidor não só está gostando como se acostumando. E quando o dinheiro escassear e todo essas ações pararem de acontecer, como será que o consumidor vai encarar os valores reais do produto ou do serviço? Será que os crescimentos exponenciais continuarão acontecendo?
Além disto, começamos a ver essas “tech” se transformarem em grandes empresas com faturamentos enormes e olhando para a economia real para continuar se financiando. Podemos ver exemplo do Uber que abriu o capital e está sofrendo, pois não consegue dar resultados dentro dos parâmetros da economia real dando lucro e criando valor no EBITDA.
O WeWork voltou atrás no seu IPO pois não convenceu o mercado do seu negócio e do seu valor.
Minha questão nesse novo cenário é até aonde a inversão de resultados tem fôlego para continuar? Em algum momento essas empresas que já estão aí precisarão andar com seus próprios recursos e dar resultado para ganharem longevidade. E as que continuarem acreditando que os aportes de capital serão infinitos ou nem nascerão ou vão morrer.
Qualquer alteração na economia mundial seja uma recessão, como alguns preveem acontecer, ou a alteração da curva de juros podem mudar radicalmente esta dinâmica dos investidores e será que esta quantidade enorme de startups ou scaleups estão preparadas para sobreviver sem tantos recursos como há atualmente?
Esta é uma questão relevante não só para os investidores como para os empreendedores, pois estamos em uma inércia perigosa que pode a qualquer momento surpreender todos que estão nesse negócio.
Vamos voltar a valorizar a última linha como um indicador importante nos negócios, mesmo que para isso o crescimento tenha que ser menos acelerado, porém mais consistente.
Por Marcelo Amarante.