Era com esta irônica placa que os clientes se divertiam ao conhecer a agência e ver aquele grupo de jovens dentro daquela “jaula” de vidro, num ritmo frenético e em frente de computadores de última geração.
Pareciam se divertir, fingiam aquele ar blazê de que não estavam sendo observados, enquanto era normal que o orgulhoso atendimento ali ao lado, concluísse: aqui está o cérebro da agência!
A história não é fantasiosa. Ela acontecia de fato e em várias agências era assim: havia uma aura de curiosidade, admiração e respeito em torno da equipe que criava, pensava e definia os destinos de um briefing e da própria agência. Naquela época, e nem faz tanto tempo assim, o importante era ser diferente, unusual, arrojado, gerar tendências, inovar e sintetizar aquilo que hoje se valoriza tanto que chegou a ter um nome só seu: economia criativa.
O que mudou hoje? Tudo. Afinal, todo mundo agora é criativo (sic)! Os criativos, cuja “única função” numa agência é justamente criar, têm hoje que dividir este processo com todos da agência, afinal, alguém disse que “Um insight pode vir de qualquer um, até da Tia do Café”, e aí vemos aquelas reuniões de brainstorming com 10/15/20 pessoas… Não tem como isto dar certo: é muita mão mexendo no bolo, é muita gente querendo dar palpite e muita opinião diferente para gente buscar algum tipo de consenso.
Mas verdade seja dita: insights podem vir de qualquer um mesmo, criar – ao meu ver – não! E se pensar pelo conceito da cocriação fosse tão abrangente, porque então não chamar também os criativos para participar de uma discussão estratégica, financeira, de business ou às vezes relacionadas ao atendimento/comercial? “Ah, mas eles não entendem disto!” Diriam alguns… Só não sei onde fica aqui então aquela questão de que o insight pode vir de todo mundo?!
E coincidência ou não, desde que todo este movimento começou, começamos a ver uma crescente e preocupante ‘commoditização’ do mercado. Os briefings pouco se diferem, quando já não vem com a ideia pronta só à espera da execução, o processo é aberto demais e não me espanto se ao perguntar o que acham dos criativos de hoje, muitos gestores reclamarem que eles participam pouco, colocam lá o seu fone de ouvido “Princesa Léa” e se distanciam do ambiente da agência, que pouco falam num brainstorming e que no fundo parecem ser mais executivos do que criativos de fato, resumindo, às vezes, como uma tremenda falta de ousadia ou ambição.
Não, não vou e nem posso generalizar, mas será que você realmente está criando um ambiente saudável para que ele seja realmente o cara diferenciado que se espera? Ou será que realmente você precisa de um cara diferenciado que ele espera? Ou ainda será que realmente o tal empoderamento criativo que foi implantado nas agências realmente trouxe algo assim tão positivo?
Estou há muito tempo no mercado, e novamente não posso generalizar, mas posso garantir que boa parte do ímpeto de cocriação é muito mais egóico e pessoal do que uma necessidade de fazer o job ficar melhor. Posso também garantir que o cara mais chato em um brainstorming não é o criativo, mas aquele que tem ideiazinhas legais e quer colocá-las a qualquer custo na primeira oportunidade.
Posso ainda te provocar convidando-o a acreditar um pouquinho no que eu estou dizendo e quem sabe resolver deixar seus criativos sozinhos, mas sei que talvez não saia tudo aquilo que você espera, e, certamente, você vai me jogar na cara que estou errado e que realmente sem a agência toda, a criação não anda. Sim, há grande chances disto acontecer. Aquele velho lance de roer tanto osso, que quando chega um filé mignon a gente não sabe comer.
Criatividade é um exercício constante. Se você tem um time onde não há necessidade de ser tão agressivo criativamente, ele não funcionará bem no momento em que precisar ser inovador ou sair da famosa caixa que ainda é citada em alguns briefings. É só lembrar do futebol americano e de seu time de defesa e de ataque.
Agências mais agressivas criativamente têm dificuldades com jobs mais comuns e vice-versa. E isto não significa um julgamento sobre a qualidade dos seus profissionais, mas sim o tipo de time que você tem ou está formando. Como fazer? Primeiro: saber claramente que time você tem. Segundo: ter uma noção clara do quanto o processo não precisa de um asset externo para dar uma up no time ou às vezes até mesmo fazer o job em formato outside. De qualquer forma, buscar ferramentas de motivação do seu time, reuniões, workshops, enfim… conhecimento, além da troca com outros profissionais, sempre será positivio.
Os criativos, assim como boa parte das pessoas no mundo, estão completamente abduzidos por este movimento que faz com que todos sejam conduzidos para as mesmas coisas e sejam patronizados. Eles se vestem igual, pensam parecido, fazem coisas similares e dificilmente têm liberdade para sair de uma expectativa muito clara de um tipo de entrega do trabalho. Tudo o que vier de acréscimo pode trazer bons resultados, acredite!
As agências também são assim. Similares na forma: paredes coloridas, tijolos à vista, uma bicicleta pendurada, cara de pub, club, galpão, indústria, enfim… Similares no conteúdo e a própria criatividade acaba virando uma bandeira de todos e de qualquer um. Como resultado, vivemos uma indústria que aspira a novidade e a inovação, mas que vive dentro de uma bolha de similaridade e tendendo ao status quo incômodo do commodity. É triste isso, mas não podemos ficar confortáveis.
O mercado vive um êxodo de ótimos profissionais. Eles resolveram ver o que há do outro lado do mundo, e, ironia do destino, são hoje eles que fazem parte de um mercado em franco crescimento, principalmente porque trazem o cheiro de novidade de conceitos como hubs, associated partnership, coworking, compartilhamento, sinergia, convergência ou simplesmente a “novidade” em atender um cliente com maior proximidade, dedicação, inteligência, e, pasmem, criatividade.
Se hoje um cliente fosse conhecer sua agência, ele veria os criativos naquela redoma de vidro ou misturados com todos? Ele enxergaria claramente quem trará novidades e inovação ao seu negócio ou teria que compreender que quem o atende é na realidade um sistema desenhado para ser inclusivo, mas não exclusivo? Ele veria uma placa irônica e divertida ou mais uma vez as clichês: “Quem manda no nosso negócio é o cliente”, “Servimos bem para servimos sempre” ou “O melhor de todos é o que fazemos juntos”?
Os clientes estão lá fora e tem um monte de agências e de profissionais livres querendo atendê-los, será que não está faltando você dar amendoim aos seus criativos?
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Nota: Eu demorei muito para honrar o incrível convite do amigo Júlio Feijó e começar a escrever no Promoview. Ele sabe que não foi uma desfeita, mas estava esperando o momento certo e ele chegou: hoje é meu primeiro dia e espero que seja de muitos. Não busco aqui consenso, mas na maioria das vezes uma provocação sadia para questionar e quem sabe repensar o mercado onde atuo há mais de 20 anos. Jamais citarei nomes, mas talvez você pense que pessoas conhecidas se encaixam em algumas descrições. Não falarei de nenhuma agência, mas eventualmente você vai achar que estarei falando de alguma em especial… E cliente para mim será sempre um termo genérico, por mais que às vezes a gente perceba procedimentos muito comuns em muitos deles.
Resumindo: “Esta não é uma obra de ficção (embora às vezes pareça), qualquer semelhança com pessoas, fatos ou situações da vida real realmente não será coincidência” (rs). A questão aqui não será “dar nome aos bois”, mesmo porque mais do que nunca hoje fazemos parte de uma grande manada. E isto é bom, mas também pode ser muito ruim. Vou dividir aqui o que aprendi como diretor e VP de criação de várias agências do mercado, mas também de uma grande vivência junto a agências como consultor e parceiro no desenvolvimento de projetos, mas principalmente de um trabalho que gosto muito com workshops, mentorings e um trabalho muito próximo para o entendimento e o fortalecimento de times, desde os criativos até a liderança, equipe de atendimento, planejamento ou a agência como um todo. Como ironia, o mesmo questionamento que eu tenho sobre o quanto realmente o processo criativo deve ser aberto dentro de uma agência ou empresa, me fez entender que a experiência com este processo, e, principalmente, com este tipo especial de profissional, me fez ver melhor o nível de exigência, de expectativas, de busca de inovação, de visão diferenciada e de metas e desafios a serem superados, que existem em todas as áreas, empresas e negócios mais modernos. E de que conhecer e ter em mente os novos conceitos sistêmicos seria a melhor forma de trabalhar uma questão importantíssima dentro deste verdadeiro ecossistema: as pessoas. Pois elas sim, são o nosso maior legado. Para finalizar, deixo uma frase do poeta curitibano Paulo Leminsky: “Distraídos venceremos”. Até a próxima semana.