Era a segunda vez em menos de 1 ano, e lá estava eu de malas prontas para embarcar para Beijing.
Objetivo: acertar todo o roteiro de uma viagem para 350 pessoas, durante os Jogos Olímpicos de 2008.
Comigo iam 3 profissionais que me ajudariam nesta tarefa: Leo, Pablo e Claudia.
Leo era um cara bonitão, sabia dar um jeito em tudo.
Pablo, um argentino gente boa, se é que isso é possível. Brincadeira…
Claudia, conheci em uma reunião, e era a chefe do grupo. Ainda bem. Alguém com juízo.
Íamos testar o caminho via Dubai.
Tudo ótimo.
…………………….
Quase 2 dias depois chegamos ao Jianguo Garden Hotel, bem no centro de Beijing.
Esta era uma das partes fáceis de nossa visita; não precisamos escolher o hotel.
Era aquele e pronto!
Simples assim.
Ato 1 – Conselho de Vó
Para construir esta viagem, estudei muito os hábitos chineses. Tive uma ajuda muito especial de uma empresa que tratava de adaptação de executivos a novas culturas.
E pude saber em que momentos deveria ter atenção.
Um dos hábitos de negócios é oferecer um jantar para seus convidados, logo que chegam de viagem.
E sempre começam com uma bebida de entrada.
Antes de sair do hotel, lembrei da minha avó que sempre aconselhava: Quando for comer na casa de quem você não conhece, faça uma boquinha antes. Vai saber que comida vão servir.
E lá estava eu comendo um misto com batata frita e ovos, antes do tal jantar.
Sorte? Não. Respeito a sabedoria dos mais velhos.
Chegamos a um lugar que mais parecia um templo do que um restaurante.
Lindo. Impressionante.
No primeiro momento nós quatro fomos apresentados a nosso guia para aqueles dias.
Fomos então para a sala de banquetes onde os principais executivos da agência de turismo do governo chinês nos esperavam.
Uma recepção cordial e fantástica!
E aí, antes de começar qualquer coisa, veio o momento drinque de boas vindas.
As portas da sala se abriram.
Um sino tocou.
E entrou um cortejo de 5 chineses, vestidos magnificamente.
Um deles carregava uma garrafa de prata.
Isto foi parar nas mãos de nosso anfitrião que logo ofereceu um shot para cada um de nós.
De derrubar qualquer um. Muito, muito forte.
Mas eu estava preparado.
Então para surpresa geral e desespero dos meus 3 companheiros, puxei um segundo brinde em homenagem a nosso relacionamento comercial.
E lá se foram meus dois amigos. Claudia se safou com a desculpa de que não estava acostumada a beber e já havia tomado um.
Mas os outros dois. Que fazer se não acompanhar.
Finalmente, depois do terceiro shot, começamos a comer.
Serviram de tudo, acho eu. Difícil pra comer. E tive de recusar uma sopinha que tinha dentro uma espécie de medusas vivas, nadando em nossos pratos.
Não ficou só nisso, infelizmente.
Muitas coisas se mexiam.
Outras tinham aspecto não muito apetitoso.
Acho melhor nem descrever o cheiro.
Não via a hora de mais um misto com Coca-Cola.
Ato 2 – A escolha perfeita
Nossa visita começa com a apresentação do hotel.
Como disse, estava escolhido, era aquele.
Assim foi com as guias, 4 chinesas que falavam espanhol.
Os motoristas que só dirigiam, e os ônibus, que eram aqueles mesmo.
Mas nem tudo estava perdido. Poderíamos escolher os restaurantes!!!
Primeira parada; um restaurante especializado em peixe, onde na entrada haviam grandes aquários e você, escolhia o peixe. Ele sairia dali direto pra panela.
Problema: ao entrar reparei que a vitrina e as lamparinas que enfeitavam o lugar estavam imundas;
Problema 2: o lugar selecionado para o grupo era muito escuro. Aliás todo o lugar era;
Problema 3 (definitivo): nos aquários da frente alguns peixes nadavam de ponta-cabeça, isto é, estavam mortos.
Próximo.
Este outro era um restaurante gourmet.
Lindo.
Começamos o menu degustação; primeira iguaria, pato, digo, somente os pés cozidos e com um pouco de algo que identifiquei como se fosse um vinagrete. Não tiraram nem as unhas dos bichos.
Depois apareceu na mesa uma coisa verde que parecia um purê de geleca. Era uma raiz rara que crescia embaixo de uma árvore que eu nem quis saber o nome.
O seguinte era como se estivéssemos comendo cérebro ou vísceras de um animal.
Próximo.
Andamos pra cima e pra baixo.
Cada um mais difícil que o outro.
Começava com os odores. Completamente diferentes.
Continuava na higiene do local.
E terminava com o aspecto da comida.
Reunião de Emergência na sede da agência.
Quero já.
Nosso guia desesperou.
Pediu um tempo pois precisava ligar para o lugar.
Se afastou.
Como se fossemos entender alguma coisa.
Mas pela expressão estava falando algo como: “Chefe a visita deu ruim. Eles querem ir até aí”.
Rodamos mais de uma hora.
Eu tenho certeza que ficaram passeando conosco.
Ao chegarmos, uma enorme recepção nos aguardava.
Uma faixa com nossas fotos e escrito BEM VINDOS em português, chá de todos os tipos.
Bolinhos de chuva.
Todos sorrindo!
Quando comecei a falar do assunto, o chefe me interrompeu e disse: “Luiz tudo está bem. Vamos apreciar o chá. Amanhã estará tudo resolvido”.
Eu e meus companheiros nos entreolhamos, tentamos insistir no assunto, mas a chefe de todos os chefes nos interrompeu dizendo: “Querem mais chá?”
Ato 3 – Preparando o que os brasileiros mais gostam de fazer em viagem: compras
Com o assunto da comida resolvido (?) agora estava na hora de pensar nas atrações para nossos viajantes.
Para isso foi necessário fazer opções.
Claro que não seria possível visitar tudo e ir aos Jogos também.
Nós nos entrosamos muito bem. E de certa forma foi tranquilo montar um programa para o grupo com as melhores atrações.
Acabamos rindo muito de todas as dificuldades que superamos.
Mas as compras foram demais.
Ato 4 – Hongquiao Market, também conhecido como Pearl Market
Nossa primeira parada.
Algumas pequenas regras de comportamento:
1 Nunca compre pelo primeiro preço;
2 Pechinche bastante;
3 Uma boa compra vai levar uns 20 minutos pelo menos;
4 Nunca demonstre muito interesse por algum produto;
5 Não compre eletroeletrônicos. Possivelmente não vão funcionar por muito tempo;
6 E se não vai comprar não pergunte. Nada. Muito menos o preço.
Me diverti muito com a brincadeira da pechincha.
Aprendi que eles não falam inglês mas a máquina de calcular fala.
De volta à nossa van compartilhamos nossas histórias e o Leo, já deveria imaginar, mostrou a sua grande barganha: uma máquina Nikon, com todos os controles possíveis e por um dinheiro muito ridículo.
“Não acredito que você comprou esta encrenca.”, disse.
“Mas Luiz foi muito barato.”
“Leo, isto não vai funcionar como uma Nikon de verdade.”
“Luiz, vai por mim. Você vai acabar querendo voltar lá e comprar uma.”
Minutos depois paramos para conhecer a Praça da Paz Celestial. Linda imponente. Histórica.
Leo imediatamente sacou sua máquina novinha e pediu: “Junta aí pra tirar uma foto!”
Na hora de bater, apertou uma, duas, três vezes.
A máquina começou a tocar uma música chinesa…
O cara enlouqueceu. Tinha comprado uma caixa de música.
“Vamos voltar lá.”
“Quero minha grana de volta.”
Hongquiao Market, aí vamos nós outra vez.
Leo saltou esbravejando e soltando um monte de palavrões.
Fomos atrás pra garantir que o cara não ia fazer bobagem eu, Claudia e Pablo.
Assim que entramos no corredor onde estava a banca onde ele comprou a caixa de fotos (rsrs) e a chinesa nos viu….Subiu em cima da banca. E enquanto subia aprendeu inglês rapidamente. E começou a gritar, com o indicador apontado para o Leo: “SECURITY, SECURITY. HELP ME. HE GAVE ME FALSE DOLARS. HE GAVE ME FALSE DOLARS.”
Chegamos de volta à van esbaforidos, depois de uma corrida no meio da multidão, satisfeitos de termos comprado uma máquina fotográfica, último tipo, que só tocava uma música.
Ato 5 – Qianmen Main Street South
No dia seguinte, mais uma visita.
Desta vez eu e Pablo decidimos ficar tomando conta do Leo para que ele não fizesse outra loucura.
E o cara cismou de comprar ternos ARMANI numa banca.
Tentamos em vão dissuadi-lo.
Impossível.
Mas onde experimentar?
Obviamente que num lugar destes não existem cabines de provas.
A chinesa então, fazendo o seu papel, pegou um pano grande e deu na mão do Pablo, uma das pontas e na minha a outra, e nos fez levantar para que o Leo pudesse provar os três ternos que queria comprar.
Mas não deu outra; Claudia no corredor olhando a façanha, a chinesa torcendo pra vender 3 Armanis.
Eu e o argentino segurando o pano.
Quando o Leo estava só de cuecas, o pano já era.
Eu e o Pablo saímos correndo.
A chinesa, ria e soltava uns gritinhos.
A Claudia puta da vida pagando geral para nós dois.
E o Leo, calmamente experimentando o terno.
Levou 2.
Ato 6 – A viagem e os viajantes
Passamos 7 dias em Beijing.
Tudo para fazer que em nosso evento não houvesse qualquer eventual.
Foi talvez a mais divertida de todas as vistorias técnicas que fiz.
Várias vezes ficamos sem ação, sem saber o que fazer, pois não conseguíamos entender nada e muito menos saber onde estávamos.
Mas conseguimos montar o programa.
Inclusive fazendo com que nosso grupo visse algumas modalidades dos Jogos de 2008 com brasileiros competindo. Fantástico.
Voltamos com muita convicção de como seria a nossa aventura. E com a mais absoluta certeza de que seria no mínimo divertido.
Tivemos passageiros comprando celulares para toda a família, até hoje não sabemos se funcionaram.
Gente comprando camisas La Coste de todas as cores e com um detalhe curioso, o jacaré estava de boca fechada.
Bolsas das mais variadas marcas, com certificado de “garantia de origem”, China.
Enfim, de tudo.
Mas o campeão de vendas, ou melhor de compras, foram os helicópteros de controle remoto. Não houve um casal que não tenha trazido pelo menos 1. Eu trouxe 2. Até hoje, não sei pra que.