Março de 2020. Linha de corte. Param as feiras em todo o Brasil e na maior parte do Planeta.
Surpresa, incredulidade, esperança de que em breve retomará, começa a demorar e vem o pânico. Junto com o pânico, brotam as alternativas virtuais. Já dizia meu avô que o pânico é o pior dos conselheiros.
Mas meu avô também costumava nos dizer sempre: “Aprenda a interpretar os sinais da vida” e acho que a vida em 2020 mandou um enorme recado aos promotores das feiras de negócios para que o modelo tradicional se atualize.
Atualizar não significa “pivotar”. Tem muita gente acreditando que as feiras virtuais representam a evolução do modelo tradicional…
Caramba, cerca de vinte anos atrás já se falava (e se tentava realizar) em feiras virtuais e elas não tiveram aderência em nenhuma parte do planeta embora tenham sido tentadas em todos os continentes.
Feiras-são locais onde as pessoas se encontram para relacionamento e negócios, para um necessário entrosamento que seja potencializador de novas oportunidades. Que demanda empatia, que demanda olho no olho.
O digital, quando inteligentemente percebido como extensão, agrega um valor importante ao evento presencial na medida em que lhe dá vida longa.
A coisa do híbrido, essa de querer tornar os eventos simultaneamente disponíveis de modo presencial e on-line, na minha visão, não se presta para a grande maioria das feiras de negócios.
Eu atuo no treinamento de expositores de feiras de negócios por mais de 20 anos. Mais de 80% deles não possui o menor preparo para obter todos os resultados que a participação em uma feira pode proporcionar.
Imagine se ele, expositor, tiver de se ocupar de uma audiência dupla e que, certamente, aquela que virá do ambiente on-line será numerosa e impregnada de curiosos fazendo perguntas e querendo detalhes, e, ainda, exigindo um atendimento “instantâneo”.
Sim, instantâneo, porque o ambiente digital sugere que esses atendimentos têm de estar sempre disponíveis de imediato, em tempo real.
Caros amigos, o primeiro mandamento do marketing é “Conheça teu cliente”. Eu creio que a maioria dos promotores de feiras de negócios que percebo caminhando para os eventos híbridos, não conhece verdadeiramente seus clientes.
Se conhecessem, certamente não estariam apostando no híbrido como solução pelo simples fato de que saberiam que os seus expositores não têm preparo (nem infraestrutura, nem equipe) para isso.
2021 já bate na porta. Vacina chegando, dia 08 de dezembro, ainda 2020, foi o dia V oficial (v de vacina, v de vitória), porquanto foi aplicada em um Ser humano a primeira vacina oficialmente testada e aprovada no Reino Unido.
Então, nos enchemos de esperanças e começamos a torcer para que esse processo seja rápido e eficaz, e que os eventos presenciais tão necessários para a economia de todo o planeta possam, enfim, retornar.
Ao retornarem, que agreguem todo o bom ensinamento proporcionado por esse período cruel da nossa história. Mas que considerem em suas ações que a “corrida digital” desses meses aconteceu por conta da inexistência dos eventos presenciais.
O mercado anseia pela volta deles. O mercado anseia por se livrar de 20 lives por dia. O mercado quer e precisa de eventos bem feitos e inteligentes.
Avatares, holografias, chatbots, nada disso combina com aquilo que o Ser humano melhor sabe fazer que é se relacionar, ao vivo e a cores.
“A Fábrica de Cretinos Digitais”. Este é o título do último livro do neurocientista francês Michel Desmurget, diretor de pesquisa do Instituto Nacional de Saúde da França, em que apresenta, com dados concretos e de forma conclusiva, como os dispositivos digitais estão afetando seriamente — e para o mal — o desenvolvimento neural de crianças e jovens.
“Mas não é surpreendente. A indústria digital gera bilhões de dólares em lucros a cada ano. E para empresas que valem bilhões de dólares, é fácil encontrar cientistas complacentes e lobistas dedicados que defendem a digitalização de tudo.”
Estaremos nós, os criadores dos eventos, entrando no jogo da indústria digital? Ainda dá tempo de reagir. Não basta arregaçar as mangas, é momento de arregaçar o cérebro. Boralá.
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