Senti daqui aquele calorzinho dos olhares enviesados e gestos de descrença. Afinal, lucro é algo que promove os abismos sociais que vivenciamos, certo? Errado.
Quando escolhemos investir no mundo dos negócios, temos que garantir que a marca, empresa, indústria, enfim, que “a entidade jurídica criada”, seja uma construção sólida e lucrativa, capaz de gerar suporte patrimonial, oportunidades para pessoas diversas e resultados.
Somente assim será possível garantir que todas as pessoas, conectadas direta ou indiretamente a este CNPJ, sejam pagas, que as relações sejam sustentáveis e que todos os envolvidos possam crescer em todas as esferas de atuação, entre elas as áreas financeira, estrutural e social.
Empreendo desde 2014, porque entendi que não poderia ser sempre voluntária. Percebi que oferecer meus serviços, se as pessoas só me chamassem para – dar palco – sem pagar por minhas horas, seria insano, um “buraco sem fundo”.
No entanto, várias vezes, ainda hoje, sou chamada para falar em workshops e oficinas em troca de “ter palco”, e essa realidade é a mesma para muitas pessoas profissionais negras e de outros grupos minorizados.
Quem nos chama pensa que nos faz um grande favor em nos receber nesses lugares para sermos as pessoas da Diversidade e Inclusão, em “nossos lugares de fala”, que desfrutam de alguns minutos de fama. Ledo engano.
Aqui deixo uma dica: Em junho é comemorado mundialmente o Mês do Orgulho LGBTQIA+, vinculado à rebelião de Stonewall, em 1969, que deu início ao dia sobre o mesmo tema, em que a comunidade celebra o #Orgulho de várias maneiras diferentes.
Se for convidar pessoas protagonistas para falar, por favor, remunere-as sempre que possível. São suas histórias, seu tempo e sua vida que estarão ali no palco. Valorize a pessoa e seus momentos.
A potência da D&I está em abrir espaços seguros para pessoas que são invisibilizadas e silenciadas. Mesmo entre os grupos minorizados, trabalhamos intensamente para que nossos negócios cresçam, buscamos formações, cursos, especializações, construímos parcerias e sempre focamos em nossos sonhos.
Geralmente, não sonhamos com voos para longe de nossas comunidades, porque entendemos o quanto podemos fazer diferença atuando com pessoas que vivem nos mesmos lugares em que vivemos.
Muitas vezes, é ali no território onde crescemos que vemos as carências a serem eliminadas e podemos fazer a diferença.
Não é preciso investimentos milionários ou a fundo perdido. Às vezes, uma pessoa tem a rede certa para apoiar, por exemplo, um coletivo de pessoas artesãs para que vendam produtos a quem não conhece seu trabalho e que pagaria por isso. Ou pode dar apoio a uma desconhecida agência de mídias digitais na sua região, conectando-a com sua rede para negócios regionais ou externos.
São essas redes que precisam ser fortalecidas, dominando as ferramentas de gestão e contando com o apoio de outros profissionais com experiência de mercado, capacidade de captação e gestão de recursos, para fomentar seu próprio crescimento.
Ainda há aquela mensagem subliminar de que tudo que vem do “outro lado da ponte” é melhor, algo que no nosso país vem da crença de que “tudo que vem de fora” é melhor.
Muitas pessoas não sabem ou se esquecem de que vários produtos com etiquetas estrangeiras são fabricados no Brasil como “White Label” – um modelo de negócios que a China tem dominado, em que indústrias fabricam e entregam produtos ou serviços, o comprador coloca sua logomarca, e vende como se toda a cadeia produtiva fosse sua, sem ter uma única fábrica aberta.
A necessidade que temos de criar coisas nossas, usar nossas marcas, ter grupos diversos é nossa conexão com o pertencimento. Há muito tempo nos são negadas nossas identidades.
Queremos produtos e serviços feitos para nós. Quando olhamos a enorme quantidade de expressões racistas e preconceituosas na Língua Portuguesa Brasileira, é nítido que desde a nossa formação inicial não somos incentivados a reconhecer a potencialidade de quem somos nem do que fazemos: o apagamento sistemático de pessoas negras, entre outras, da história brasileira retrata esse fenômeno.
Em tempo: Merecemos desfrutar do lucro! Ele precisa parar de soar como algo maléfico, que corrompe a vida humana, porque o dinheiro não tem esse poder.
Como diz Ayn Rand, desenvolvedora do sistema filosófico chamado de Objetivismo: “Dinheiro é apenas uma ferramenta. Ele irá levá-lo onde quiser, mas não vai substituí-lo como motorista”.
Dentro dos ecossistemas das periferias, há muitas pessoas que vivem de pequenos negócios, são modelos familiares para dar suporte ao maior número de pessoas que podem alcançar, enquanto ficam em casa, cuidando da família.
Há também pessoas com Ensino Superior em diversas áreas. Nos dois cenários, muitas dessas pessoas atuam em negócios que precisam de acesso a crédito para crescer, contratar mais pessoas da região e mudar a qualidade de vida do território.
É nessas regiões que a potência da D&I tem mais possibilidades de gerar lucro. A diversidade abre espaço para que mais pessoas sejam ouvidas em suas necessidades, mostrem quem são e colaborem para um mundo com condições mais equânimes para todas as pessoas.
A meta não é utópica: Todos merecem vidas dignas e apoio para criar ambientes sustentáveis e saudáveis, sem medo da opressão violenta dos preconceitos.
As empresas que entenderem essa proposta e começarem a olhar os grupos diversos de seus colaboradores, aproximarem-se dessas realidades, criarem conexões reais para promover o desenvolvimento e não o assistencialismo, certamente encontrarão relações e lucro saudáveis, além de sustentabilidade no longo prazo, porque semearão na prática o respeito a uma rede humanizada de empresas e pequenos negócios que serão prósperos onde mais são necessários.