*por Patrícia Paixão
Dia 9 de maio de 1958. O jornalista Audálio Dantas publicava, no jornal Folha da Manhã (atual Folha de S. Paulo), trechos dos geniais diários de Carolina Maria de Jesus, amplificando para todo o Brasil o talento de uma das principais escritoras da nossa literatura, até então não devidamente reconhecido em um país marcado pelo racismo estrutural e pelo preconceito contra os mais pobres.
Leia também: Marketplace com conteúdo é o diferencial
A partir da reportagem que reproduziu parte dos diários de Carolina, diversos leitores puderam conhecer o sofrido dia a dia dos que viviam como ela em uma favela, além de atestar sua instigante escrita. Após a repercussão da matéria, Carolina publicou o livro “Quarto de Despejo: Diário de uma favelada”, sucesso em mais de 40 países, traduzido para 13 idiomas.
Dia 21 de fevereiro de 1979. O jornalista Antonio Carlos Fon causava alvoroço nos corredores do poder, com uma grande reportagem que desnudava os órgãos de segurança do regime militar, mostrando seu modus operandi e as formas de tortura que eram por eles praticadas. O texto, que marcaria a história do nosso jornalismo, foi publicado na revista Veja.
Dia 8 de junho de 2020. Dois dias após o governo federal ter comunicado que simplesmente deixaria de informar o número de mortes e casos diários de Covid-19, em um momento crítico, em que nosso país se posicionava como terceiro no ranking mundial com mais mortes acumuladas em decorrência da doença, os principais veículos jornalísticos brasileiros, ignorando o fato de serem concorrentes, anunciaram que iriam se unir em um consórcio voltado a contabilizar e informar esses dados à sociedade.
Esse texto certamente poderia se estender para milhares de caracteres, citando muitos outros registros que comprovam o caráter essencial da profissão de jornalista para a sociedade. Em especial em um país como o nosso, marcado por tanta desigualdade, injustiças, abusos de todo o tipo de poder e diversas chagas sociais.
O jornalismo em todo o mundo, sobretudo aqui, tem representado, muitas vezes, o último porto seguro para cidadãos relegados pelo Estado e explorados por grupos poderosos.
Por isso 7 de abril é data de celebração para todos que valorizam essa atividade que é essencial na garantia da democracia, na defesa dos direitos humanos, na fiscalização aos poderes.
Não por acaso, nós, jornalistas, recebemos tantos ataques. Incomodamos e MUITO. Jogamos um facho de luz sobre a escuridão que propositalmente tentam lançar sobre questões de interesse público. Colocamos nossas canetas, gravadores e microfones à disposição dos historicamente ignorados.
Nenhuma agressão, verbal ou física, poderá nos barrar ou mudar essa realidade. Nenhum ataque será capaz de nos enfraquecer, pelo contrário. As pedradas, as críticas e as tentativas de macular nossa carreira só reforçam a indignação e a vontade de seguir com veemência nosso trabalho.
E é por isso que, passados mais de 20 anos da minha formação na faculdade, continuo com a mesma empolgação dos primeiros dias, enchendo a boca para dizer: SOU JORNALISTA. Comemoro a data de 7 de abril com muito orgulho. Não com um orgulho tolo e arrogante, de quem se acha mais importante que os outros, mas um orgulho com contornos de gratidão, por poder exercer uma profissão com a qual posso fazer a diferença na vida das pessoas.
O jornalismo é tudo isso e muito mais. Como disse Gabriel García Márquez, é uma “paixão insaciável” que, mesmo exigindo muito de seus profissionais e sendo alvo permanente, é constantemente renovada. Ontem, hoje, no futuro, estaremos sempre a postos para sermos os olhos e os ouvidos dos cidadãos, doa a quem doer, custe o que custar.
*Patrícia Paixão é jornalista e professora do curso de Jornalismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM). É doutora em Integração da América Latina pela Universidade de São Paulo, organizadora da série de livros Mestres da Reportagem e editora do @FormandoFocas.