O lendário Festival South by Southwest nasceu a partir de um grupo de amigos que queriam mudar a cidade, valorizar os talentos locais e trazer artistas e emprendedores para Austin, na década de 80, em pleno Texas, um estado tradicionalmente conservador.
Provavelmente era um cenário desafiador para quem quisesse recriar um modo de vida mais alternativo ao American Way of Life, numa região em que o patriotismo por vezes sufocava quem ali quisesse expandir sua curiosidade para outros sotaques, indo além dos Estados Unidos para uma amplitude mais universal.
Ares de contracultura tomariam as ruas da cidade a cada edição do SXSW. Ao mesmo tempo, as oportunidades e exceções geralmente viram negócios nos Estados Unidos. O caso do slogan “Keep Austin Weird”, algo como “Mantenha Austin estranha”, é bem curioso: surgido num programa local de rádio em 2000, foi adotado pela Aliança de Negócios Independentes de Austin como forma de marketing que impulsionou um turismo peculiar e ainda protege seu mercado local.
Outro título da cidade é a de capital da música ao vivo nos Estados Unidos, o que afirma sua vocação para esse mercado.
Para ser diferente, sempre é necessária uma boa dose de coragem e ousadia. Assim, Austin respira com sua excentricidade promissora e o Festival South By Southwest faz parte dessa construção de identidade provocativa e posicionamento rebelde frente aos tradicionais americanos de plantão.
Esse Festival, que transformou Austin, uma cidade “caipira”, reposicionando-a como vitrine das novidades tecnológicas do mundo, passou a atrair marcas internacionais de prestígio em atual evidência, além de 150 mil pessoas de todas as partes do mundo, para uma maratona de 10 dias de troca de informações.
Google, Youtube, Dropbox, Spotify, Samsung, Sony e outras referências mundiais sabem que o SXSW é o lugar certo para experimentar novas campanhas.
O investimento no engajamento transmídia junto ao público em diversas plataformas simultâneas é visível, pois sabem da reverberação internacional imediata numa escala que vai do velho boca a boca à hashtag exponencial multiplicada por pessoas que trafegam entre realidades virtuais e reais em vários continentes em poucos minutos.
Não à toa o presidente Barack Obama esteve na abertura oficial do painel de Interatividade, assim como a primeira-dama Michele abriu o painel de Música com um projeto social (Let Girls Learn) que visa a igualdade de gêneros a partir de mais oportunidade de estudos para jovens mulheres no mundo.
Estavam ambos no lugar certo para os holofotes destacarem a imagem da Casa Branca que investe no futuro, ou seja, nessa geração que já nasce com chip e com o protagonismo como base.
Agora são esses grandes nomes de prestígio internacional que estão de olho em como aprender com jovens de startups a fazer marketing efetivo e com personalidade.
Uma curiosa rede e inversão de papéis se configura entre os corredores, as rodadas de negócios e papos nas filas de festas: investidores estão tendo que se abrir a novas formas de lucro, reaprendendo com a turma jovem, que tem um compromisso além da venda, com seus múltiplos talentos e ideais coletivos.
Fica evidente o fundamental investimento e estudo aprofundado acerca das redes sociais, do protagonismo, autonomia e originalidade como regras do jogo. Os experts de mercado que não se ligarem nos youtubers de 21 anos vão ficar pra trás nessa acelerada Era Transmídia.
E, como sempre, o SXSW revela a tendência do ano e dos dias porvir: a realidade virtual e seu legado cyborg em plena efervescência. Projetos ousados e preconizadores de novas formas de se fazer negócios, onde a criatividade e o toque autoral são a Lei.
Isso prova que a essência do Festival continua nesse intuito de reunir talentos e criar um ambiente produtivo para negócios criativos e inspirador de modo que cada um acredite nas suas ideias e faça valer a sua missão nessa vida.
A Era Transmídia permite que poucos amigos, moradores de uma cidade em que não existia vida cultural como prioridade de Governo, ao realizarem um simples festival de música (que se ampliou para o cinema e incorporou a interatividade ao longo das décadas) reposicionem Austin como o novo Vale do Silício.
A mentalidade coletiva para a prosperidade e o empreendedorismo contagiaram nessa temporada de Festival, em que as pessoas estão dispostas a conhecer sonhos, projetos, ideias do outro.
Existe uma disposição para a troca e, entre uma rodada de negócios e um almoço na rua, esbarramos com grandes líderes de empresas renomadas ou mesmo pessoas pelas quais temos admiração sejam do Lado B independente ou do mainstream.
Esses novos líderes engajados mostram que estão na missão certa quando estimulam o melhor de cada um na sua equipe, ao invés de suscitar que copiemos um modelo de prosperidade vendido como auto-ajuda ou de cura motivacional para empresários com lista de passos a seguir para se tornar milionário – mas de alma vazia.
A onda do South by Southwest que nos contagia é de que podemos investir nos nossos talentos com bastante dedicação, criando as oportunidades em sincronia com pessoas que atuam nesse sentido de constante aprimoramento e mudança.
Claro, com muito estudo e coragem de errar, corrigir o fluxo e sempre renovar os ânimos, mantendo o ritmo de árduo e prazeroso trabalho. Sim, podemos trabalhar com arte e tecnologia de forma próspera e conectada com o mundo e com aqueles ao nosso redor.
Para aqueles que pensam que se fantasiar de Stevie Jobs para impressionar um empresário americano é a garantia de um contrato, um alerta: perdem a oportunidade de se serem originais e de se reconhecerem como brasileiros tão admirados pela inventividade e personalidade criativa que são nosso diferencial.
Essa alteridade e encontro com a diversidade nos traz a chance de vermos quem somos e o que temos de especial para depois seguirmos, cada um na sua terra, com mais firmeza e confiança em apostar no que vem de dentro. Nenhum rótulo se sustenta por muito tempo.
A questão das novidades tecnológicas é um parque de diversões para os adultos e entusiastas à procura de novidades. No entanto, o tema transfigura estes momentos de euforia e deve contemplar uma cosmo-ética para além dos andróides: a inteligência artificial tem que se integrar ao modo orgânico para, com a inteligência humana, se transmutarem em aplicativos e projetos para fins coletivos.
Fiquemos atentos para que a robótica e neurobiologia estejam a nosso favor e não apenas como um espetáculo hipnotizante de ilusão virtual neon de curta duração e alheia ao colega ali do lado, ao que se faz necessário para melhorias na sociedade, desplugando um pouco dos compulsivos hábitos cibernéticos para abrir os olhos para a sorte que está logo aqui.
O poder do evento está na celebração dos encontros, da curiosidade incessante e interesse em conhecer o outro e afinar o que cada um tem de melhor, concretizando seus próprios sonhos em forma de projetos e articulações. O SXSW está um passo à frente por estar sempre conectado ao presente.